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3º ano 4º ano Endocrinologia Medicina Interna

A Dapaglifozina e Cetoacidose Euglicêmica: já ouviu falar?

Cetoacidose Euglicêmica e sua relação com a Dapaglifozina
Escrito por Guilherme Pompeo
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A dapaglifozina é uma medicação utilizada atualmente, com muitos efeitos benéficos, no tratamento da Diabetes Mellitus do tipo 2, inclusive com comprovação de atividades cardioprotetoras (recentemente o fármaco foi liberado para o tratamento de pacientes com insuficiência cardíaca com fração de ejeção reduzida).

A droga atua inibindo um tipo específico de cotransportador de sódio – glicose (SGLT2) presente nas células tubulares renais (ou seja, reduz a reabsorção de glicose pelo túbulo renal, tendo efeito hipoglicemiante), e é considerada muito segura.

No entanto, um de seus efeitos adversos, embora não tão comum, tem intrigado a comunidade médica e possui suma importância para o reconhecimento e tratamento, já que se trata de uma emergência, a cetoacidose diabética.

O que é mais interessante é que a dapaglifozina pode ser uma causa de cetoacidose diabética euglicêmica (efeito ocorrido com outros inibidores do SGLT2, como a empaglifozina).

ANTES DE COMEÇARMOS, DE FATO, A CETOACIDOSE, VAMOS CITAR ALGUMAS DAS PRINCIPAIS VANTAGENS DOS INIBIDORES DE SGLT2 (ISGLT2):

São drogas que contribuem no controle glicêmico, através da redução da reabsorção de glicose pelos túbulos renais, além de possuírem efeitos cardioprotetores e de perda de peso.

A CETOACIDOSE EUGLICÊMICA CAUSADA PELOS ISGLT2:

Em maio de 2015, a FDA (Food and Drug Administration) alertou sobre o aumento de risco de cetoacidose com o uso de ISGLT2.

Na maioria dos episódios já relatados de cetoacidose com o uso dessas substâncias, houve um fator contribuinte, como infecção, alimentação errada, gastroenterite aguda.

Ainda assim, devemos ficar atento para esse potencial efeito adverso das drogas em questão.

Vale recordar que a cetoacidose causada nesse contexto é EUGLICÊMICA!

Há um número importante de relato de casos de pacientes que desenvolveram cetoacidose euglicêmica em uso de algum inibidor de SGLT2, até mesmo com a dapagifozina.

OK, GUILHERME! E QUAIS SERIAM OS MECANISMOS PARA ESSE POSSÍVEL EFEITO ADVERSO?

Como os ISGLT2 possuem efeito de redução dos níveis séricos da glicose, acredita-se que haja uma redução dos níveis circulantes de insulina. Isso, por si só, seria capaz de aumentar as taxas de lipólise e cetogênese hepática e, consequentemente, elevando os níveis circulantes de corpos cetônicos.

Ainda existem efeitos adicionais que poderiam contribuir para os níveis mais altos de corpos cetônicos, como uma possível reabsorção de acetoacetato pelos túbulos renais (efeito secundário à diferença de potencial elétrico causada pela maior concentração de sódio – carga positiva – no fluido tubular renal – efeito esse já comprovado com inibidores não seletivos de canais cotransportadores de sódio – glicose nos túbulos renais. Acredita-se que ocorra o mesmo efeito com os ISGLT2).

Sendo assim, a maior produção de corpos cetônicos, em associação com uma menor depuração dos mesmos, contribui para ao maior nível sérico desses componentes.

Não paramos por aí. Alguns estudos em humanos foram capazes de demonstrar que tanto a empaglifozina quanto a dapaglifozina aumentam os níveis séricos de glucagon, sendo o mesmo responsável por promover cetogênese hepática (Ferranini E et al; Merovci A et al).

Um estudo recente também demonstro que o SGLT2 é expresso nas células alfa do pâncreas, envolvidas diretamente no mecanismo de regulação do glucagon (Bonner C et al).

QUAIS OS PRINCIPAIS CUIDADOS QUE DEVEMOS TER COM ESSAS DROGAS COM RELAÇÃO À CETOACIDOSE DIABÉTICA?

A cetoacidose diabética (CAD) facilitada pelo uso dessas substâncias é euglicêmica, o que já dificulta nosso diagnóstico, já que estamos mais familiarizados com aquele paciente que chega ao departamento de emergência apresentando CAD com níveis glicêmicos muito elevados, acidose importante, dor abdominal, letargia e CETONÚRIA.

Aqui está outro ponto, meus amigos! A CAD proporcionada pelo possível uso dessas medicações não costuma se apresentar com cetonúria, o que atrasa ainda mais nossa hipótese.

Lembra que um dos possíveis mecanismos para a cetoacidose seria a maior reabsorção de corpos cetônicos ocorrida no túbulo renal? Então, não há uma excreção elevada dos mesmos na urina!

Outro ponto e cuidado importante é, ao iniciar tais medicações em pacientes já em uso de insulina, nosso cuidado deverá ser redobrado, pela chance (mesmo que rara) de ocorrer CAD euglicêmica.

Reduzindo a dose de insulina administrada (hábito comum ao se associar um ISGLT2) na terapêutica do paciente, estamos expostos às consequências dessa redução: aumento de lipólise (e consequentemente de corpos cetônicos circulantes secundário à cetogênese hepática).

O QUE DEVO LEVAR DE IMPORTANTE DESSA LEITURA SOBRE A CETOACIDOSE EUGLICÊMICA?

O texto trata de drogas cada vez mais utilizadas na prática clínica, pelos seus efeitos benéficos metabólicos e pela sua segurança (a despeito do efeito adverso relatado no nosso artigo) e, portanto, devemos conhecer como agem tais drogas e seus possíveis prejuízos também.

Apesar de um efeito colateral raro, é de suma importância ter conhecimento sobre a sua existência e sua forma de apresentação (acidose metabólica, com ânion gap aumentado, em paciente euglicêmico, sem cetonúria, em paciente diabético em uso de algum ISGLT2) para que os clínicos e médicos atuantes no departamento de emergência possam cogitar tal hipótese diagnóstica e reconhecê-la de forma rápida, a fim de tratá-la e evitar desfechos piores.

Fique também com um Resumo preparado com carinho pelo Jaleko, sobre a Insuficiência Adrenal:

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Guilherme Pompeo

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