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3º ano 4º ano Ginecologia

Tudo sobre a Doença Inflamatória Pélvica (DIP)

Doença Inflamatória Pélvica
Escrito por Hanna Salomao
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A doença inflamatória pélvica (DIP) é conhecida por um conjunto de processos inflamatórios na região pélvica gerados pela propagação de microrganismos a partir do colo do útero e da vagina, para o endométrio, tubas, peritônio e estruturas adjacentes.

A propagação ocorre diretamente do colo para as estruturas superiores, através da via canalicular. A inflamação pode estar presente em qualquer ponto de sequência que inclui cervicite, endometrite, salpingite, peritonite.

Constitui umas das mais importantes complicações das Infecções sexualmente transmissíveis (IST’s) e um grande problema de saúde pública.

É mais prevalente entre as mulheres jovens – 15 e 25 anos-, já que esse grupo, com frequência, realiza sexo desprotegido, tendo maior chance de contrair os agentes causadores das cervicites, importantes para o desencadeamento da Doença Inflamatória Pélvica.

A sua relevância está atrelada às suas complicações emergenciais como a pelviperitonite ou ruptura de abscesso tubo ovariano (ATO), como àquelas que acontecem a longo prazo, como a infertilidade, gravidez ectópica e dor pélvica crônica.

A manifestação da DIP, muitas vezes, possui um padrão subagudo ou pouco sintomático, sendo que a dor abdominal em diversas intensidades é um sintoma obrigatório. No entanto, pelo fato dos sintomas poderem ser discretos, o diagnóstico pode passar despercebido.

Somado a isso, além de ser oligossintomática na grande maioria, não possui notificação obrigatória, o que, de fato, contribui para a falta de dados exatos da sua incidência no Brasil.

Os principais agentes identificados são a Chlamydia trachomatis e a Neisseria gonorrhoeae (gonococo).

Fatores de risco da Doença Inflamatória Pélvica

A identificação desses fatores pode auxiliar na prevenção e no manejo terapêutico das pacientes. Dentre os fatores de risco para DIP temos a adolescência (menores que 25 anos) e o comportamento sexual.

Como dito anteriormente, ocorre porque essa população se submete mais comumente a fatores comportamentais, como múltiplos parceiros e sexo desprotegido, mas também há influência de fatores biológicos, como a baixa prevalência de anticorpos contra Clamídia, muco cervical mais permeável e a ectopia da junção escamo colunar mais frequente.

É importante ressaltar que a multiplicidade de parceiros e a presença de um parceiro atual com uretrite devem chamar atenção para a possibilidade de desenvolver DIP.

Outros fatores citados na literatura, incluem: condição socioeconômica – acredita-se ser pela maior promiscuidade sexual entre aqueles que se encontram nas classes menos favorecidas, embora tenha aumentado a incidência de DIP nos últimos anos nas classes mais favorecidas -, e tabagismo, alcoolismo e uso drogas – são imunossupressivos e se associam ao desenvolvimento de DIP aguda.

Além disso, outros fatores associados são: história de doença sexualmente transmissível, DIP prévias ou atuais – pessoas com infecção por clamídia, micoplasmas e/ou gonococo na cérvice uterina têm maior chance de desenvolver essa infecção no trato genital superior.

O uso de dispositivos intrauterinos (DIUs) pode representar um risco três a cinco vezes maior para o desenvolvimento de DIP se a paciente for portadora de cervicite na época de inserção, caso não seja, foi demonstrado que esse risco não se justifica, principalmente com os dispositivos mais atuais.

Já a vaginose bacteriana, embora não tenha uma relação direta, acredita-se que ela facilita a ascensão da clamídia e do gonococo no trato genital.

Etiologia da DIP

Em estudos pioneiros da DIP, a Neisseria gonorrhoeae (gonococo) era o patógeno mais isolado. Contudo, como houve uma queda da prevalência da doença sexualmente transmitida por esse agente, de forma correspondente, sua importância como causador de DIP também diminuiu.

Atualmente, a Chlamydia trachomatis é o mais detectado em até 60% das mulheres com salpingite e endometrite, embora o gonococo ainda seja o agente primário.

Algumas outras bactérias podem estar associadas, como: Mycoplasma hominis, Mycoplasma genitalium, Ureaplasma urealyticum, Gardnerella vaginalis e Bacteroides spp, além de outros germes responsáveis por vaginoses, que também podem contribuir para o aparecimento da doença.

À medida que o processo infeccioso e inflamatório ocorre, a concentração de oxigênio diminui localmente, possibilitando o aumento de anaeróbios, dentre eles: Bacteroides fragilis, Peptostreptococcus spp e Prevotella spp.

De uma forma geral, a DIP possui etiologia polimicrobiana, sendo importante lembrar que em mulheres com infecção por gonococo e clamídia, a detecção de anaeróbios no trato genital superior está frequentemente associada com a doença mais grave.

Fisiopatologia da Doença Inflamatória Pélvica

A fisiopatologia da DIP é melhor elucidada quando dividida de forma segmentar, isto é, desde a infecção do colo uterino pelos patógenos primários até a ascensão da infecção para locais como as tubas uterinas, ovários e peritônio pélvico.

Inicialmente, os patógenos envolvidos na cervicite – principalmente a Clamídia -, se instalam no local caracterizando o estágio 0, chamado de pré-DIP. É importante identificar essa fase, pois, dessa forma, é possível tratar e prevenir a DIP de fato.

Posteriormente a essa fase, principalmente no período menstrual ou pós-menstrual imediato, ocorre ascensão dos microrganismos passando pelo endométrio, gerando uma endometrite fugaz e possibilidade de sangramento discreto, além da menstruação ou mesmo o prolongamento desta.

Além disso, há modificação do muco cervical com a menstruação ou após essa fase, o que contribui para esse processo. Alguns autores dizem que o sangue proveniente da menstruação é alcalino, formando, portanto, um meio de cultura.

Em seguida, os patógenos ascendem, via canalicular, até as tubas uterinas, se instalando no local. Inicia-se uma reação tecidual, com formação de conteúdo purulento, que pode chegar até o peritônio pélvico – através das fímbrias -, e causar a chamada pelviperitonite.

O acúmulo é maior no fundo de saco de Douglas, então nessa topografia ocorre maior sensibilidade, com dispareunia e dor ao toque vaginal. Concomitante a isso, as alças intestinais e epíplon tendem a bloquear o processo purulento, dando origem ao “complexo tubo-ovariano”.

A viscosidade do conteúdo pode aumentar e levar ao quadro de piossalpinge, no qual ocorrefusão das fímbriascom aprisionamento de pus dentro das tubas uterinas.

O conteúdo aprisionado faz com que ocorra queda dos níveis de oxigênio e aumento gradativo na proliferação dos anaeróbios em detrimento dos aeróbios.

Todo esse pus pode chegar até os ovários, levando ao surgimento do abscesso tubo-ovariano, que pode ficar esterilizado e formar uma massa multicística com conteúdo citrino estéril, chamada de hidrossalpinge.

Em um quadro de maior gravidade, o conteúdo do abscesso pode aumentar a pressão dentro dele mesmo e romper, extravasando para o peritônio e levando ao choque séptico e óbito.

Já a dor, ela ocorre a partir da entrada dos patógenos na cavidade uterina, aumentando a intensidade caso o conteúdo purulento contamine a cavidade pélvica.

É interessante que a dor pode diminuir relativamente no momento em que ocorre a fusão das fímbrias e se tornar máxima quando ocorre a ruptura do abscesso.

Diagnóstico da DIP

Em virtude da ampla variedade de sinais e sintomas, que podem ser desde quadros leves até intensamente dolorosos, o diagnóstico pode ser difícil.

Deve-se analisar inicialmente a forma clínica, sendo que o tratamento deve ser iniciado antes mesmo da confirmação laboratorial ou de imagem.

A DIP deve ser pensada principalmente em mulheres na faixa etária de 14 a 44 anos que apresentem dor abdominal baixa ou dor pélvica à mobilização da cérvice, ainda que os sintomas sejam leves.

Os exames laboratoriais podem ser normais e, para o diagnóstico definitivo, em alguns casos, pode ser necessário exame laparoscópico.

A paciente com DIP pode ser assintomática ou apresentar sintomas que incluem: dor abdominal ou pélvica, febre, calafrios, corrimento vaginal ou cervical, prurido, dor, sangramento vaginal ou alteração do ciclo menstrual, dispareunia, disúria – sobretudo na presença de uretrite -, dor lombar, náuseas e vômitos.

O diagnóstico diferencial deverá ser feito com manifestações uroginecológicas, gastrointestinais e musculoesqueléticas, e devem incluir: gravidez ectópica, tumor, torção ou cisto ovariano, aborto séptico incompleto, endometriose, adenomiose, leiomioma uterino, endometrioma roto, nefrolitíase, pielonefrite, cistite, litíase urinária, apendicite, síndrome do intestino irritável, dentre outros.

Existem alguns exames complementares que podem ser solicitados caso haja suspeição de DIP, são eles: hemograma completo (pode mostrar leucocitose e aumento de bastões), exame de urina tipo I e urocultura, provas bioquímicas inflamatórias (velocidade de hemossedimentação – VHS, PCR), exame bacterioscópico, provas de biologia molecular, teste de gravidez, ultrassonografia transvaginal, que pode apontar algumas alterações como espessamento da parede tubária, líquido tubário, bem como abscesso tubo-ovariano.

Caso o resultado da ultrassonografia seja inconclusivo, ainda pode-se lançar mão da tomografia computadorizada, ressonância magnética, bem como da laparoscopia.

De acordo com o Centers for Disease Control and Prevention (CDC), para se ter o diagnóstico de DIP, devemos ter o somatório dos três critérios obrigatórios a pelo menos um dos critérios adicionais.

Dentre os critérios obrigatórios, temos: dor em baixo ventre espontânea, dor á palpação anexial e dor à mobilização cervical.

Já dentre os considerados adicionais, temos: temperatura oral maior que 38,3 °C, secreção vaginal/cervical anormal, VHS ou PCR aumentados e isolamento de gonococo ou clamídia endocervical.

Existem, também, os critérios específicos, que um deles já conclui o diagnóstico de DIP, são eles: ultrassonografia endovaginal ou ressonância magnética ou outro método de imagem sugerindo a presença de ATO ou complexo tubo-ovariano, biópsia endometrial demonstrando a presença de endometrite e laparoscopia demonstrando sinais sugestivos de infecção tubária ou tuboperitonial.

Tratamento da Doença Inflamatória Pélvica

É importante que o tratamento seja feito o mais precocemente possível com o intuito de não deixar sequelas futuras e evitar complicações. É importante a atenção quanto a presença de outras infecções sexualmente transmissíveis associadas.

Deve ser solicitado testes sorológicos para HIV, sífilis e hepatites, bem como deve ser feito o rastreamento de neoplasias associadas como a infecção pelo papilomavírus humano (HPV). O parceiro, mesmo que assintomático, deve ser examinado e tratado contra a clamídia e gonococo.

Se o tratamento será ambulatorial ou hospitalar, vai depender da situação em que se encontra o indivíduo.

Sendo assim, a primeira escolha para o tratamento ambulatorial é com Ceftriaxona associada à Azitromicina via oral. Já quando ocorre a internação hospitalar, opta-se por utilizar Ceftriaxona em conjunto com Metronidazol, ambos pela via endovenosa.

Caso não ocorra evidência de melhora, será necessário avaliar a necessidade de procedimento cirúrgico, principalmente na possibilidade de existência de foco de abscessos em outros locais abdominais (goteiras parietocólicas, subfrênico, peri-hepático na síndrome de Fritz-HughCurtis etc.), ou resistência ao esquema de antimicrobianos utilizados.

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Hanna Salomao

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