Antes de começarmos a falar de síncope, precisamos definir a mesma. A definição mais clássica de síncope consiste em perda súbita e transitória da consciência, com incapacidade de manutenção do tônus postural e recuperação espontânea. O mecanismo básico para essa ocorrência se dá por uma hipoperfusão cerebral generalizada e transitória.
Aproximadamente 3% de toda a população apresenta síncope em algum momento da vida (dado subtraído do estudo Framinghan, que acompanhou mais de 5 mil indivíduos por mais de 26 anos).
Nesse artigo vamos dar foco para um tipo específico de síncope, a vasovagal, uma das mais prevalentes no nosso meio.
A importância de saber sobre síncope
A síncope trata-se de um problema muito presente no prontossocorro, sendo responsável por 3 a 5% dos atendimentos na emergência, além de ser causa de 1 a 6 % das internações hospitalares.
Quais são suas classificações?
Podemos classificá-la de diversas maneiras. Vou citar aqui a escolhida pela Sociedade Europeia de Cardiologia:
– Síncope neuromediada: síncope vasovagal clássica; síncope do seio carotídeo; situacional; formas atípicas;
– Hipotensão ortostática: falência autonômica primária; falência autonômica secundária; induzida por drogas; depleção de volume;
– Síncope cardíaca: arritmias cardíacas (tanto as bradiarritmias quanto as taquiarritmias); doença cardíaca estrutural.
Sabemos hoje que as síncopes neuromediadas são as mais frequentes, dentre elas a vasovagal (8 a 37% dos casos); situacional (1 a 8%), seguidas pelas causas cardiológicas.
Como definir o tipo de síncope?
A história bem realizada e o exame físico são capazes de definir a etiologia da síncope em quase 50% dos casos. Além disso, podemos lançar mão de alguns exames complementares no auxílio dessa investigação.
Segundo a Sociedade Europeia de Cardiologia, o algoritmo de investigação da síncope consiste em:
. História clínica e exame físico -> Eletrocardiograma (se normal e > 45 anos: massagem do seio carotídeo) + Radiografia de tórax + Ecocardiograma -> Presença de cardiopatia estrutural e/ou arritmia?
. Aqui demos uma parada ->
. SE A RESPOSTA FOR SIM:
– teste de esforço + Holter de 24 horas + MAPA + avaliar cineangiocoronariografia + avaliar estudo eletrofisiológico. Se positivos, direcionar a terapia e acompanhamento clínicos específicos. Se negativo, solicitar Tilt test e avaliação neurológica (se positivo, tratamento específico).
SE A RESPOSTA FOR NÃO:
– Tilt test (se positivo, tratamento específico. Se negativo, volta para a etapa acima).
No caso das síncopes vasovagais, o exame complementar com maior capacidade de auxiliar no diagnóstico é o Tilt teste.
Existe algum critério diagnóstico para síncope vasovagal?
Sim, existe! Vamos continuar utilizando os dados e recomendações da Sociedade Europeia de Cardiologia:
– Critérios diagnósticos para síncope vasovagal:
. ausência de doença cardíaca;
. longa história de síncope recorrente;
. síncope inesperada após som, cheiro, dor;
. síncope após ficar tempo prolongado em posição ortostática, lugares fechados e quentes;
. associada com outros sinais/sintomas como náuseas e vômitos;
. episódio que ocorre durante uma refeição ou pós prandial;
. síncope após rotação da cabeça ou compressão no seio carotídeo;
. episódio após o esforço
Quais são as indicações para o Tilt teste?
Uma das principais indicações para a realização desse exame complementar no contexto de síncope é aquela que apresenta alto risco (trauma físico; acidente automobilítisco; profissões de risco como motoristas, pilotos de avião, operadores de máquinas pesadas, entre outras) e que são recorrentes, na ausência de cardiopatia estrutural (ou após exclusão de possíveis causas cardíacas na presença de algum “defeito” estrutural).
Outras indicações são: diagnóstico diferencial entre síncope convulsiva e epilepsia; avaliação da hemodinâmica do paciente durante o episódio da síncope; avaliação de lipotímia e tonturas recorrentes; avaliação de pacientes que apresentem quedas recorrentes de etiologia inexplicada.
– Quais são as contraindicações para o teste?
. Obstrução da via de saída do ventrículo esquerdo;
. Estenose mitral grave;
. Estenose grave e proximal de coronárias;
. Estenose crítica em vascularização cerebral.
– Quais são os padrões de resposta ao teste de inclinição?
Eles podem ser separados em:
. Vasovagal clássica (neurocardiogênica);
. Disautonômica (hipotensão postural);
. Síndrome postural ortostática taquicardizante (POTS);
. Psicogênica
De acordo com o tipo de resposta da pressão arterial (PA) e da frequência cardíaca (FC) ao teste, o Grupo de Estudo Internacional de Síncope Vasovagal a classifica da seguinte maneira:
. Resposta mista – Tipo I (após aumento da PA e FC, ocorre queda da PA > 30 mmHg ou PA sistólica < 80 mmHg com redução da FC > 10% do basal);
. Resposta cardioinibitória – Tipo II (diminuição exagerada da FC < 40 bpm por mais de 10 segundos ou assistolia por mais de 3 segundos);
. Resposta vasodepressora – Tipo III (queda da PA com síncope sem diminuição importante da FC).
Qual o principal objetivo do tratamento desse tipo de síncope?
Bom, temos como principal meta nesse cenário aumentar a sobrevida, impedir as injúrias físicas por trauma que podem ser decorrentes da perda da consciência, evitar a recorrência dos episódios.
Os diferentes tratamentos são:
– Terapia não farmacológica:
Na síncope vasovagal clássica, as medidas dietéticas, orientações gerais e orientações sobre o comportamento geralmente são suficientes para controlar a recorrência dos sintomas. Faz-se importante esclarecer o bom prognóstico desse tipo de síncope aos pacientes, assim como reforçar como evitar os fatores predisponentes como ambientes fechados e quentes, desidratação, postura ortostática por tempo muito prolongado, uso de medicações como diuréticos, vasodilatadores, entre outros.
Muitos dos pacientes apresentam sinais/sintomas prodrômicos e devem ser orientados a adotarem uma postura defensiva e segura para evitar possíveis quedas. Alguns outros pacientes se beneficiam em dormir com cabeceira elevada; com o uso de meia elástica nas panturrilhas.
Outra orientação prática e importante é, quando o paciente se encontrar exposto a situações que podem proporcionar a crise, adotar manobras como cruzar as pernas, pressionar as próprias mãos. Isso permite com que a crise seja retardada ou até mesmo abortada.
– Tratamento farmacológico:
Uma parcela pequena dos pacientes pode apresentar episódios recorrentes e muito frequentes, reduzindo em muito a qualidade de vida. Com isso, alguns se beneficiam do tratamento medicamentoso.
Muitas vezes a fludrocortisona é utilizada como medicamento de primeira opção nos casos de síncope vasovagal ou hipotensão ortostática não respondedoras às medidas comportamentais. Essa é um mineralocoticoide que acarreta retenção de sódio e consequente expansão do volume intravascular e vasoconstricção periférica.
No entanto, um estudo importante (POTS II), comparou essa medicação com placebo e não demonstrou redução importante na recorrência de síncope. Ainda assim, especialistas sugerem esse fármaco como opção terapêutica para aqueles pacientes que possuem recorrência de síncope, são mais jovens e não possuem história de insuficiência cardíaca.
Algumas outras classes de drogas podem ser utilizadas na tentativa de alívio de sintomas muito recorrentes e frequentes. Esses medicamentos são agentes alfa adrenérgicos e vasoconstrictores (ex.: midodrina e etilefrina); inibidores de recaptação da serotonina (paroxetina; fluoxetina; sertralina) e betabloqueadores (ex.: metoprolol).
Sendo assim, os recados mais importantes sobre a síncope vasovagal são: trata-se de uma condição benigna, com bom prognóstico, que deve ser corretamente diagnosticada para que o paciente seja tranquilizado e possa ser orientado de forma definitiva para a prevenção das crises e melhora da qualidade de vida do mesmo!