CONHECENDO UM POUCO SOBRE O ASSUNTO:
A fibromialgia é um acometimento caracterizado por dor crônica, o qual possui um tratamento desafiador para a prática médica. As intervenções abrangem medidas farmacológicas e não farmacológicas, que geralmente são oferecidas em conjunto (maior benefício). Geralmente, esses pacientes vão responder muito melhor a um tratamento individualizado e multidisciplinar, com auxílio de médicos, outros profissionais da saúde, reabilitação e especialistas de saúde mental.
Este artigo tem como principal objetivo resumir e demonstrar algumas das estratégias que podemos lançar mão para o tratamento desses pacientes, que possuem uma redução muito drástica na qualidade de vida quando não tratados.
VISÃO GERAL DO TRATAMENTO:
O principal pilar do tratamento está na tentativa de alívio dos principais sintomas dessa desordem: dor crônica, insônia, fadiga e disfunção cognitiva.
Antes mesmo de disponibilizarmos as medidas farmacológicas, a abordagem inicial consiste em confirmar o diagnóstico, explicar a condição para o doente, e avaliar e tratar possíveis comorbidades, como distúrbios do humor e do sono. Além disso, é imprescindível um programa de exercícios, devendo ser prescrito tanto exercícios aeróbios, quanto de força.
Para os pacientes que não respondem às medidas não farmacológicas, iremos iniciar um regime de droga única (e ainda mantemos as atividades não farmacológicas). As drogas a serem utilizadas sozinhas inicialmente são: amitriptilina, duloxetina ou pregabalina.
Naqueles pacientes ainda refratários, haverá outras estratégias para a abordagem, inclusive associação de drogas.
Foi falado de forma geral cada “step” para o tratamento desses pacientes. Agora, vou comentar de forma mais detalhada o passo a passo.
– Educação do paciente: os pacientes portadores de fibromialgia devem entender a sua doença antes de qualquer tratamento proposto. Os pontos principais a serem abordados aqui é esclarecer que a fisiopatologia da doença até hoje não é bem estabelecida, e demonstrar a importância que o próprio paciente terá no seu tratamento. Alguns pontos chaves nesse primeiro passo são:
. Demonstrar e reforçar para o paciente que a fibromialgia é uma doença real e não algo “da cabeça dele”. Aqui, é interessante explicar que muito da doença tem relação com neurotransmissores e hormônios que atuam na percepção da dor, da fadiga, nos distúrbios do humor e, por isso, muitas vezes utilizamos medicações como antidepressivos;
. Explicar a relação com estresse e alguns distúrbios do humor, incentivando o paciente a encontrar técnicas de relaxamento e procurar programas de redução do estresse de forma oficial;
. Esclarecer que, apesar de muitas vezes o quadro inicial de fibromialgia ser deflagrado por uma infecção, a doença em si não possui uma relação direta com doenças infecciosas (acredite! Muitos pacientes acreditam que possuem uma infecção por portarem fibromialgia);
. Reforçar a relação com distúrbios do sono, orientando medidas de higiene do sono;
. Abordar o exercício: explicar ao indivíduo que existem hipóteses sobre o espasmo muscular e o déficit de fluxo sanguíneo para os músculos e pele, que podem justificar as dores. Com o exercício, há uma otimização de tal fluxo;
. Falar sobre o prognóstico: o paciente precisa compreender que os sintomas vão oscilar, porém, que dor e fadiga costumam persistir de maneira crônica. Mas, apesar disso, a maioria dos indivíduos com fibromialgia vivem normalmente e levam vidas ativas.
O EXERCÍCIO:
O exercício físico gera uma série de benefícios para os pacientes com fibromialgia, como alívio da dor, ganho de funcionalidade, melhora do sono. A orientação mais atual é a de manter esses pacientes em um programa de exercício cardiovascular.
Qual a principal dificuldade de convencer o paciente a aderir o exercício físico? Bom, é difícil convencê-lo que a piora da dor e da fadiga (que realmente acontece) somente ocorre no início do programa, mas que tende a melhorar, e muito. Dessa forma, devemos orientar que o paciente aumente o nível de exercícios bem gradualmente.
Exercícios aeróbicos de baixo impacto, como caminhar rapidamente, nadar, pedalar, hidroginástica são algumas das modalidades mais aceitas por esses pacientes. Obviamente, o programa de exercícios deve ser individualizado para cada pessoa. O treinamento ideal tem como objetivo um mínimo de 30 minutos, 3 vezes por semana, atingindo perto da frequência cardíaca alvo. Mesmo aqueles pacientes que não conseguem atingir esse objetivo devem continuar sendo encorajados da prática de exercício de forma regular.
E AS MEDICAÇÕES QUE POSSO UTILIZAR?
Na maioria dos pacientes com fibromialgia, recomenda-se, além das medidas comportamentais, a utilização de medicamentos associados.
As drogas que são benéficas cientificamente comprovadas são antidepressivos e anticonvulsivantes. Alguns exemplos de antidepressivos utilizados são amitriptilina (tricíclico), duloxetina (inibidor da receptação da serotonina e norepinefrina). Ciclobenzaprina é um exemplo de tricíclico (não utilizado para depressão) também aplicado na fibromialgia. Já os anticonvulsivantes com benefício são gabapentina e pregabalina.
E como escolho qual utilizar? Bom, a opção por cada uma dessas drogas deve levar em conta cada paciente individualmente, os sintomas mais prevalentes, efeitos adversos, possibilidade financeira, tolerância de cada indivíduo, entre outras variáveis.
Em geral, tentamos iniciar o tratamento com o uso de um tricíclico. Caso o paciente apresente uma resposta inadequada ou algum tipo de intolerância, substituímos por um inibidor da receptação da serotonina e norepinefrina ou algum anticonvulsivante.
. Tricíclicos: na maioria das vezes, são medicações efetivas para o tratamento inicial da fibromialgia. Recomenda-se iniciar a terapia com uma dose baixa dessas drogas (ex.: 10 mg de amitriptilina) à noite. O aumento da dose pode ser realizado de 5 em 5 mg a cada duas semanas, baseado na melhora dos sintomas e possíveis efeitos adversos de cada indivíduo (a dose de 20-30 mg/dia é efetiva na maioria). Naqueles pacientes com sintomas mais intensos, a ciclobenzaprina pode ser uma alternativa à amitriptilina.
. Ciclobenzaprina: é uma alternativa à amitriptilina (principalmente nos casos com sintomas moderados). Possui efeito mínimo como antidepressivo (não utilizado para esta terapêutica). Também iniciamos esta droga em doses baixas, geralmente pela manhã. Em caso de sonolência associada ao seu uso, podemos administrar à noite.
Como alternativa à amitriptilina no tratamento inicial ou como opção aqueles pacientes não respondedores, entram em cena as drogas como pregabalina e duloxetina.
. Duloxetina: muito bem indicada nos casos não respondedores ou intolerante à amitriptilina, ou em pacientes com transtorno depressivo associado à dor, ou em fadiga intensa.
Pode ser utilizada em período diurno, na hora do café da manhã. Iniciada com 20-30 mg/dia, podendo chegar progressivamente à dose recomendada de 60 mg/dia.
Já conseguimos ver melhora parcial da dor na primeira semana de uso. Os principais efeitos adversos documentados são náusea, cefaleia e “boca seca”.
. Pregabalina: também utilizada como alternativa à substituição da amitriptilina (quando necessário) ou nos quadros em que há dor associada com distúrbio importante do sono (insônia). A dose inicial entre 25-50 mg/dia à noite na hora de dormir, com doses progressivas, até atingir a dose tolerada (objetivando 300-450 mg/dia). Alguns pacientes respondem com doses menores (100-300 mg/dia) e não necessitam de acréscimo.
. Gabapentina: as evidências do uso desta droga são mais limitadas. Costumamos utilizá-la como opção à pregabalina naqueles que possuem alguma dificuldade em usar a mesma (financeira ou por efeitos adversos).
A dose inicial é de 100 mg/dia na hora de dormir, aumentando gradualmente até a dose tolerada (objetivando 1200-2400 mg/dia). Assim como com a pregabalina, alguns pacientes são respondedores com doses menores do que a dose alvo.
Os efeitos adversos mais notados são “mal estar” e ganho de peso.
QUAL O PAPEL DOS ANALGÉSICOS CLÁSSICOS?
Não há evidência de que os analgésicos clássicos, assim como antiinflamatórios não esteroidais, sejam efetivos no tratamento da fibromialgia. No entanto, podem e continuam sendo utilizados como terapia adjuvante.
Esses pacientes não respondem bem aos opioides e alguns estudos relatam até resultados piores nos que fazem uso, quando comparados aos que não fazem.
O QUE FAZER NOS PACIENTES QUE NÃO RESPONDEM À TERAPIA INICIAL?
Apesar dos nossos esforços, muitos pacientes apresentam sintomas persistentes a despeito da terapia inicial (medidas não farmacológicas + única droga). Nesses indivíduos, recomenda-se a associação de medidas, bem como:
– Combinação de drogas;
– Intensificação em programas de educação e reabilitação física;
– Terapia cognitivo comportamental;
– Avaliação multidisciplinar com reumatologista, fisiatra, psiquiatra, psicólogo, especialista em sono e em controle da dor (a depender das queixas mais importantes);
– Atualmente, em casos totalmente refratários, terapias alternativas como terapias “mente corpo” são orientadas (ex.: tai chi e ioga).
PAPEL DE TERAPIAS COMPLEMENTARES E ALTERNATIVAS:
Uma revisão sistemática de 2015 demonstrou que muitas formas de terapia alternativa podem ter um efeito benéfico na fibromialgia, e deve ser aconselhada nos pacientes que não atingem melhora, apesar de todas as medidas anteriores, ou naqueles que se negam de todas as formas a realizar as medidas farmacológicas.
Os resultados positivos demonstrados nessa revisão foram baseados na prática de tai chi, ioga, meditação e algumas formas de intervenção como hipnose.
Após a leitura deste artigo, percebemos que o tratamento da fibromialgia é um tema complexo e que necessita da avaliação de múltiplos profissionais, principalmente nos casos mais difíceis e refratários. No entanto, o tratamento inicial pode e deve ser iniciado na medicina primária, e ganhando complexidade de acordo com a não resposta dos pacientes.
Outro importante é a relevância da associação das medidas farmacológicas e não farmacológicas, o encorajamento da atividade física e da higiene do sono.
É muito bom saber que além das terapêuticas farmacológicas tradicionais existem outras abordagens nutricionais, dietéticas e de suplementação que podem contribuir com o tratamento da fibromialgia.
agradecido
Olá, tudo bem? Realmente a gente deve sempre lembrar que tratar não é só prescrever remédio. A maior parte das doenças tem muito mais que só isso. Um grande abraço, Dr. Felipe Magalhães – diretor médico
Reitero que é muito bom saber que além das terapêuticas farmacológicas existem outras abordagens nutricionais, dietéticas e de suplementação que podem contribuir com o tratamento da fibromialgia.
agradecido
É isso mesmo, Marcelo! Continue acompanhando a gente =)