Também descrita como síndrome da compressão extrínseca do ducto biliar comum, é uma das causas de obstrução da via biliar, que leva ao quadro de icterícia.
Foi descrita, em 1948, pelo médico argentino Pablo Luis Mirizzi, que deu o epônimo da patologia.
Aproximadamente, 0,1% dos pacientes diagnosticados com litíase biliar apresentam o quadro. Além disso, mesmo os pacientes que já foram submetidos à colecistectomia (retirada da vesícula biliar) podem apresentar o quadro, por mecanismos de fibrose.
RELEMBRANDO A ANATOMIA
Para entender a síndrome, é importante relembrarmos as relações anatômicas do fígado e das vias biliares. Sabe-se que a bile é produzida no fígado e é drenada pelos ductos hepáticos direito e esquerdo, até o ducto hepático comum. Este último deságua na vesícula biliar, que é um importante armazenador da bile. Conforme nossa alimentação e processo digestivo, a vesícula biliar se contrai e libera essa bile através do ducto colédoco que, por sua vez, deságua na segunda porção do duodeno.
FISIOPATOLOGIA
A síndrome de Mirizzi pode ser causada por uma colecistite crônica (inflamação crônica da vesícula biliar) ou por um cálculo impactado no infundíbulo da vesícula biliar. Dessa forma, não há nada dentro dos ductos biliares comuns (hepático e colédoco) causando uma obstrução. O processo compressivo vem de fora para dentro.
As duas etiologias se desenvolvem de forma diferente, porém, o quadro clínico resultante é o mesmo.
No caso da colecistite crônica, ocorre uma fibrose da região, que pode levar a compressão do colédoco ou do hepático comum, devido à proximidade das regiões.
No caso do cálculo impactado no infundíbulo, este, por sua vez, causa uma compressão mecânica da via biliar comum, levando à uma obstrução semelhante e icterícia colestática.
É importante entender que o cálculo pode ser a etiologia de colecistites crônicas, como também pode ser o principal mecanismo de obstrução da via biliar.
QUADRO CLÍNICO
O quadro clínico da síndrome de Mirizzi é reflexo da colestase, apresenta todos os comemorativos desse fenômeno e muitas vezes é difícil de distinguir de outros casos semelhantes. O quadro agudo pode conter dor abdominal em hipocôndrio direito, icterícia, colangite e sintomas de colecistite.
Laboratorialmente, podemos encontrar hiperbilirrubinemia direta e aumento de fosfatase alcalina e gamaglutamil transferase (Gama-GT), ambas conhecidas como enzimas canaliculares das vias biliares e são típicas dos quadros obstrutivos.
CLASSIFICAÇÃO
Conforme o quadro de obstrução avança, o processo inflamatório local, suas citocinas e a agressão da via biliar podem evoluir com uma complicação temida: A fístula. Daí, surge a classificação da síndrome de Mirizzi:
Tipo I (Sem presença de fístula)
IA: Ducto Cístico presente
IB: Ducto Cístico ausente ou obliterado
Tipo II-IV (Presença de fístula)
II: Invade menos que ⅓ do diâmetro do colédoco
III: Invade de ⅓ à ⅔ do diâmetro do colédoco
IV: Invade mais de ⅔ do diâmetro do colédoco
DIAGNÓSTICO
O diagnóstico, geralmente, é feito por meio de um exame de imagem, pois a diferenciação entre outros quadros de obstrução é difícil.
Ultrassonografia, Colangioressonância magnética e Tomografia computadorizada são úteis para fazer este diagnóstico. A ecoendoscopia apresenta, para síndrome de Mirizzi, sensibilidade de 97% e especificidade de 100%, tornando-se o padrão ouro para diagnóstico Muitas vezes, a colangiopancreatografia retrógrada endoscópica (CPRE) também faz o diagnóstico, geralmente solicitada para resolução de um quadro de icterícia obstrutiva.
É comum também que haja diagnóstico intraoperatório, muitas vezes suspeitado pela grande quantidade de fibroses e aderências na região do trígono de Callot.
TRATAMENTO
O tratamento desta patologia é cirúrgico, necessitando de alto grau de experiência do cirurgião, a fim de evitar possíveis lesões no trato biliar.
No caso do Mirizzi tipo I, é possível realizar apenas uma colecistectomia simples, sem maiores complicações. Caso haja suspeita de cálculo remanescente, ainda é possível associar com uma CPRE pós-operatória.
No caso dos tipos II e III, talvez seja necessário realizar uma colecistectomia parcial, preservando a parte do infundíbulo, retirada dos cálculos remanescentes, e a colocação de um dreno de Kehr para drenagem do colédoco.
Nos quadros do tipo IV, é necessária uma hepaticojejunostomia com reconstrução em Y de Roux ou uma coledocoduodenostomia látero-lateral, ambas cirurgias muito complexas.
Portanto, é importante entender que a síndrome de Mirizzi, comparada com outras etiologias de colestase, nunca deve ser sua primeira opção diagnóstica. No entanto, temos que ter em mente que casos assim podem ocorrer, e uma abordagem desprevenida pode ser fatal pro paciente. Uma via biliar mal abordada aumenta as taxas de morbidade e mortalidade, tornando necessário um prévio conhecimento da anatomia biliar do paciente e possíveis adversidades.
Em 08/1998 fiz a cirurgia de Colecistectomia, que até então seria normal, 40 minutos de cirurgia e acabou sendo três horas e meia de cirurgia e quando acordei estava com dois drenos, pois estava com a síndrome de mirizzi. Foi muito difícil, fiquei internada 6 dias com acompanhante e depois ainda com os drenos fiquei mais duas vezes internada, e sinceramente até hoje não sei direito o que aconteceu, acho que foi tudo muito estranho e os médicos não conseguiam entender o que estava acontecendo comigo. Mas agora está tudo bem.
Eu tive isso, estágio 4. Parabéns pelo texto, muito elucidativo.