Antes de qualquer coisa, gostaria de ressaltar, neste artigo, a crescente prevalência e incidência desse distúrbio no mundo atual. A apneia obstrutiva do sono tem intensa relação com a obesidade e esta, por sua vez, vem cada vez mais presente no nosso modelo de vida (principalmente ocidental), trazendo o distúrbio que vamos abordar neste artigo à tona.
Dessa forma, não será incomum você se deparar (ao ouvir histórias ou até presenciar) com pacientes, familiares, colegas de plantão, com queixas como ronco e apneia, durante a noite ou sono excessivo durante o dia. Neste contexto, devemos ligar a luz amarela e suspeitar da apneia obstrutiva do sono.
COMO, DE FATO, EU DEFINO O QUE É A APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO?
É um distúrbio respiratório caracterizado como pausas repetidas da respiração (apneia) e/ou reduções da inspiração (hipopneias), por pelo menos 10 segundos, na presença de esforço tóracoabdominal, durante o sono.
Estes episódios estão associados à hipoxia intermitente e fragmentação do sono, acarretando em sonolência excessiva durante o dia (o que pode ser o dado relevante para a suspeita diagnóstica).
E DE ONDE SURGE, O QUE CAUSA E QUEM ESTÁ PREDISPOSTO À APNEIA DO SONO?
Bom, vamos por partes! O distúrbio é causado por obstrução e/ou colapso dos tecidos moles da faringe.
– Fatores anatômicos: causas de obstrução nasal, aumento da complacência das partes laterais da laringe, aumento do palato mole, macroglossia, micrognatismo, hipoplasia mandibular, síndromes como síndrome de Down, Marfan, Prader Willi;
– Fatores não estruturais: obesidade, período pós menopausa, uso de álcool, tabagismo, roncos, posição supina durante o sono.
Como fatores de risco, a própria obesidade entra nesse campo, além da insuficiência cardíaca, fibrilação atrial, hipertensão refratária, DM tipo 2, arritmias noturnas, AVC, hipertensão pulmonar, pré operatório de cirurgia bariátrica, sexo masculino, idade maior prevalência em indivíduos com mais de 65 anos), e também cirurgias de vias aéreas prévias por motivos de ronco.
E QUAIS PROBLEMAS UMA “BREVE PARADINHA” NA RESPIRAÇÃO E UM “RONQUINHO” DURANTE O SONO PODEM CAUSAR NA MINHA VIDA OU NA VIDA DE MEUS PACIENTES?
Bom, já é conhecido que a apneia obstrutiva do sono se associa com diversas comorbidades cardiovasculares (principais causas de morte no mundo), metabólicas e pulmonares. Além disso, o distúrbio em questão, por si só, já pode ser considerado fator de risco para doenças cardiovasculares e AVC isquêmico. Também está relacionada como causa de hipertensão secundária. Há alguns relatos de maior exposição a acidentes durante o trabalho, pela sonolência excessiva que a enfermidade pode ocasionar.
JÁ ENTENDI QUE O PACIENTE PODE RONCAR E FAZER APNEIA E HIPOPNEIA DURANTE O SONO. HÁ ALGO MAIS NO QUADRO CLÍNICO QUE EU PRECISE SABER?
Em geral, o quadro clínico é insidioso e, muitas vezes, passam anos até a realização do diagnóstico. Existe uma regra mnemônica na tentativa de facilitar alguns dos principais sinais/sintomas, os 3 “S”:
– snoring: roncos progressivos, sensação de sufocamento;
– significant-other reported apneia episodes: episódios importantes de apneia flagrados pelo parceiro;
– sleepness: sonolência excessiva diurna.
Outros sintomas que podemos observar são: engasgos, diversos despertares durante a noite, noctúria, sudorese noturna, sono agitado, irritabilidade e distúrbios do humor (afinal, quem consegue ser feliz não dormindo bem?), fadiga inexplicada, inatenção, déficits de memória, boca seca, cefaleia matinal, disfunção sexual, refluxo gastroesofágico, entre outros.
COMO REALIZO O DIAGNÓSTICO DEFINITIVO?
Antes de partir para os exames específicos, algumas avaliações, durante o exame físico, contribuem para direcionar a probabilidade pré teste de síndrome de apneia obstrutiva do sono.
Para isso, uma avaliação craniofacial se faz necessária, checando redução da altura da face, retrognatia e micrognatia, deslocamento da articulação temporomandibular. Na avaliação geral, obesidade, circunferência do pescoço (medida na altura da membrana cricotireoidea) > 40 cm são dados que aumentam a probabilidade pré teste.
Na complementação da investigação, há 2 questionários que podem auxiliar muito no diagnóstico (questionário de Berlim e escala de sonolência de Epworth). O primeiro serve como rastreamento para a síndrome, enquanto o segundo é um dado a mais para reforçar a hipótese diagnóstica.
Agora, chegamos no momento de falar do grande método diagnóstico: a Polissonografia.
POLISSONOGRAFIA E OS CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS:
O padrão ouro para o diagnóstico é a polissonografia completa em laboratório, sempre devendo ser preferida como exame de avaliação inicial. No entanto, é fundamental adicionar a impressão clínica e avaliação pré teste.
UM DETALHE ANTES DE PROSSEGUIRMOS: O QUE É CONSIDERADO HIPOPNEIA?
– redução do fluxo de 50% ou mais, associada à queda de, no mínimo, 3% na SatO2; ou
– redução do fluxo inspiratório de 50% ou mais, associada à um despertar; ou
– redução do fluxo inspiratório entre 30% e 50% associada à queda mínima de r% na SatO2.
CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS:
O diagnóstico da síndrome da apneia obstrutiva do sono é feito com a combinação de A + B + D ou C + D.
A. No mínimo 1 queixa de:
– sono não intencional durante período de vigília, sonolência excessiva diurna, fadiga, insônia, sono não reparador;
– acordar durante a noite com pausas respiratórias, engasgos ou asfixia;
– relato do(a) companheiro(a) de roncos altos e apneia durante o sono.
B. Polissonografia com mais de 5 eventos respiratórios por hora de sono (apneia, hipopneia, despertares associados a esforço respiratório);
C. Polissonografia com mais de 15 eventos respiratórios por hora de sono (os mesmos documentados no critério B);
D. Distúrbio não pode ser mais bem explicado por outro distúrbio do sono, outras condições clínicas ou neurológicas, uso de medicamentos ou abuso de substâncias.
HÁ ALGUM TIPO DE CLASSIFICAÇÃO?
Claro! Podemos classificar da seguinte forma:
. Leve: 5-15 eventos por hora;
. Moderada: 15-30 eventos por hora;
. Grave: > 30 eventos por hora.
JÁ SEI TUDO SOBRE APNEIA OBSTRUTIVA DO SONO E DAS SUAS CONSEQUÊNCIAS, MAS COMO POSSO TRATÁ-LA?
Neste tópico, existirão as medidas gerais e as medidas específicas. Iremos começar pelas medidas gerais.
O emagrecimento se faz essencial para a atenuação dos sintomas da síndrome, suspensão de bebidas alcoólicas e medicamentos com efeito sedativo, além de optar pelo decúbito lateral (em geral, a apneia piora em decúbito dorsal).
Existem alguns dispositivos orais para atuação na síndrome, bem como o avanço mandibular (eficaz para ronco primário, síndrome de resistência de vias aéreas superiores e síndrome da apneia obstrutiva do sono leve); dispositivos de retenção lingual (geralmente causam desconforto ao paciente, tendo baixa adesão).
O principal tratamento consiste no uso do CPAP (continuous positive air way pressure), para aqueles que apresentam índice apneia-hipopneia > 15. Quando o índice se encontra entre 5-14, o CPAP é indicado naqueles pacientes que apresentam sonolência diurna excessiva. Bom lembrar que os dispositivos mais utilizados são máscara nasal ou nasobucal.
A principal desvantagem do método é a aceitação do paciente. Após 2 semanas de iniciada a terapia, deve-se avaliar a adaptação do indivíduo, com reavaliação mínima de 1 vez ao ano.
O tratamento com CPAP gera melhora importante dos sintomas em curto prazo (principalmente roncos e sonolência diurna). Em 4-8 semanas, já percebemos melhora no humor, na memória, nos níveis pressóricos e na qualidade de vida em geral. E já existem dados que reforçam aumento da sobrevida em mais de 5 anos quando o CPAP é utilizado por > 6 horas por noite.
APÓS LER ESTE ARTIGO, VOCÊ SABERÁ ORIENTAR MELHOR SEUS PACIENTES, AMIGOS, CONHECIDOS, PARCEIROS A TER MELHOR QUALIDADE DE VIDA, ALÉM REDUZIR RISCOS DE DOENÇAS CARDIOVASCULARES E MUITAS OUTRAS CONSEQUÊNCIAS CITADAS NO TEXTO.