Você já ouviu falar de ânion gap? Sabe para que serve? É um achado relevante para você ou apenas um valor que fica jogado no cantinho da sua gasometria arterial? Dependendo das suas respostas, esse artigo vai ser benéfico para você! Ajudará você a interpretar melhor este achado e usá-lo de forma mais adequada.
Antes de mais nada, precisamos saber o que é, de fato, esse tal de ânion gap.
O QUE É?
O ânion gap (também conhecido como intervalo aniônico ou hiato aniônico) nada mais é do que a diferença entre os cátions presentes no sangue (principalmente sódio) e os ânions (principalmente bicarbonato e cloro), ou seja, é o “buraco” entre um e outro. A soma de todos os cátions deve ser igual a soma de todos os ânions no nosso organismo. No entanto, somando o principal cátion (sódio) e os principais ânions (cloro e bicarbonato), essa conta não fecha. Por isso, há uma quantidade de cargas negativas (das mais variadas) que são formadas pelo famoso ânion gap.
Por exemplo, o valor normal de sódio no plasma é aproximadamente 140 mEq/L, o de cloro 105 mEq/L e o de bicarbonato 24 mEq/L. Portanto, somando os cátions e diminuindo os ânions mais importantes, há uma diferença de 11 unidades. Dessa forma, essas 11 unidades são formadas por ânions não aferidos nos exames de sangue de rotina. Esses são os elementos formadores do ânion gap.
COMO CALCULAR?
O cálculo se dá da seguinte forma:
Sódio + cátions não mensuráveis = Cloro + Bicarbonato + ânions não mensuráveis
No entanto, os cátions não mensuráveis possuem um valor mínimo, sendo omitidos da conta real. Sendo assim, a forma final será:
Ânion gap (ânions não mensuráveis) = Sódio – (Cloro + Bicarbonato)
QUAIS SÃO OS COMPONENTES DO ÂNION GAP?
O ânion gap é formado principalmente por proteínas plasmáticas (principalmente albumina), sulfato, fosfato, e ácidos orgânicos (lactato, citrato, urato). Desses todos, a albumina é o componente que possui maior representatividade.
Por isso, em situações de hipoalbuminemia o ânion gap estará reduzido. Existe até uma fórmula para corrigi-lo nessas situações:
Ânion gap corrigido = Ânion gap + 2,5 (albumina normal – albumina observada)
EXISTEM OUTROS FATORES CAPAZES DE DIMINUIR O ÂNION GAP?
Sim! Além da hipoalbuminemia, hipercalemia, hipercalcemia e hipermagnesemia podem reduzir o valor do ânion gap.
QUAL SEU VALOR NORMAL?
O valor considerado normal na maioria das referências abrange a faixa entre 3-10 mEq/L. No entanto, esse valor pode variar de acordo com o laboratório.
Para grau de comparação, sempre seria bom ter amostras do mesmo laboratório. Em casos que temos acesso a valores de ânion gap prévios do mesmo paciente, isso pode nos ajudar bastante no nosso julgamento.
ÓTIMO! E PARA QUE SERVE?
Vamos começar aos poucos! A principal função dele é na diferenciação das acidoses metabólicas. Usualmente, as acidoses metabólicas produzidas por geração de metabólitos ácidos (ex.: lactato, citrato, entre outros) serão as acidoses metabólicas com ânion gap aumentado. Por outro lado, outras desordens responsáveis pelo surgimento da acidose metabólica, geralmente, causam uma acidose hiperclorêmica (ânion gap dentro da faixa normal – em geral, acidose por perda de bicarbonato).
Sendo assim, muitas vezes o valor do ânion gap pode auxiliar na suspeita diagnóstica, pensando mais em algumas hipóteses em detrimento de outras.
QUAIS SÃO AS CAUSAS DE ACIDOSE METABÓLICA COM ÂNION GAP ELEVADO?
Pessoal, as causas são inúmeras! Iremos destrinchar algumas das mais importantes e citar outras:
. Acidose láctica: situação muito comum em condições associadas à hipoperfusão, podendo ser secundária a quadros de hipotensão sistêmica. Ou seja, quadros de choque podem gerar esse tipo de acidose. Outras entidades associadas são: malignidade, alcoolismo, disfunção mitocondrial, entre outras.
. Cetoacidose: resultado de diabetes mellitus descontrolada ou de abuso crônico de álcool.
. Doença renal crônica (ou aguda): pacientes com lesão renal grave podem apresentar acidose metabólica com ânion gap aumentado. Isso ocorre devido à retenção de hidrogênio e também de alguns ânions como sulfato, fosfato e urato.
. Ingestão de álcool tóxico: por exemplo, metanol e etilenoglicol, que são metabolizados em diversos ácidos orgânicos.
. Intoxicação por salicilato
. Acetaminofeno
Abaixo, podemos verificar uma pequena tabela, com algumas das causas e mecanismos de acidose com ânion gap aumentado ou normal:
Mecanismo de Acidose | Ânion gap elevado | Ânion gap normal |
Aumento da produção de ácidos | . Acidose láctica . Cetoacidose . Ingestão de: – metanol; – etilenoglicol; – aspirina; – tolueno | . Ingestão de tolueno (se tardia, e com função renal preservada) |
Perda de bicarbonato ou de seus precursores | | . Diarreia ou outras perdas intestinais . Acidose tubular renal tipo 2 . Pós tratamento de cetoacidose . Inibidores de anidrase carbônica |
Diminuição da excreção de ácidos renais | . Doença renal crônica | . Doença renal crônica + disfunção tubular . Acidose tubular renal tipo 1 . Acidose tubular renal tipo 4 |
OUTRAS SITUAÇÕES ATÍPICAS DE AUMENTO OU DIMINUIÇÃO O ÂNION GAP:
Como já mencionado várias vezes anteriormente, a causa mais comum de elevação dos níveis de ânion gap são as relacionadas com acidose metabólica e suas consequências. No entanto, existem fatores outros (muito mais raros) que também possibilitam seu aumento.
. Outras causas (menos comuns) de elevação do ânion gap:
Hiperalbuminemia, hiperfosfatemia ou paraproteínas aniônicas (ex.: imunoglobulina A) são fatores que aumentam o ânion gap. A alcalose metabólica também pode acarretar um discreto aumento do mesmo.
. Causas de ânion gap reduzido:
Podemos começar com o exemplo de gamopatia monoclonal de IgG (podendo acarretar até níveis negativos de ânion gap).
Agora, a causa mais comum, disparadamente, de ânion gap reduzido é: ERRO LABORATORIAL!!! Portanto, fique atento com isso! Caso você se depare com alguma situação com ânion gap reduzido ou negativo, pense várias vezes na possibilidade de ser erro laboratorial.
BOM, MEUS AMIGOS, ERA ESSA A MENSAGEM DO NOSSO ARTIGO! ESPERO QUE ALGUMAS COISAS TENHAM SE ESCLARECIDO NA CABEÇA DE VOCÊS SOBRE ESTE ASSUNTO!!!
Bom dia,
muito obrigado pela postagem.
Eu fiquei um pouco confuso com sua tabela,
Nós temos nela: Mecanismo de Acidose – Ânion gap elevado – Ânion gap normal (esses estão em negrito por isso acompanhei a tabela na ordem vertical).
No Ânion gap normal
na tabela seguindo a ordem vertical encontramos:
* Diarreia ou outras perdas intestinais . Acidose tubular renal tipo 2 . Pós tratamento de cetoacidose . Inibidores de anidrase carbônica
* Doença renal crônica + disfunção tubular . Acidose tubular renal tipo 1 . Acidose tubular renal tipo 4
Se o Anio Gap está normal como pode ter doenças crônicas, diarreia etc…
Eu apenas não entendi se puder me ajudar por favor, muito obrigado Guilherme Pompeo!
Bom final de semana!
Acabamos de te responder, Edu! Confere no seu outro comentário, por favor!
Olá! Muito obrigado pela pergunta! Na verdade, ter Anion Gap normal não tem relação com doença crônica. Ânion Gap mostra a existência de um ânion, não medido, aumentado. Então, algumas doenças sistêmicas, como a diarreia, podem ter Ânion Gap normal, enquanto outras, como a doença renal crônica, ter Ânion Gap aumentado. Um grande abraço, Dr Felipe Magalhães – Diretor Médico