No dia 23 de novembro é celebrado o dia de combate/enfrentamento ao câncer infantil, doença que vem aumentando cada vez mais.
A data foi instituída em 2008, pela Lei nº 11.650, de 4 de abril de 2008, visando promover debates e discussões sobre o tema.
Os objetivos são estimular ações educativas e preventivas relacionadas ao câncer infantil, promover debates sobre as políticas públicas de atenção integral às crianças com câncer, apoiar as atividades organizadas e desenvolvidas pela sociedade civil em prol das crianças com câncer.
Também busca difundir os avanços técnico-científicos relacionados ao câncer infantil, além de apoiar as crianças com câncer e seus familiares.
O câncer infantil
O câncer infantil, que é composto por um grupo de doenças, representa hoje a principal causa de morte nas crianças e adolescentes.
O Instituto Nacional do Câncer – INCA, em uma pesquisa recentemente realizada, mostra que nos próximos dois anos (2020-2022), o Brasil terá 625 mil novos casos de câncer, e dentre esse número, 3% ocorrerá nas crianças, ou seja, mais de 18 mil casos.
O câncer infantil geralmente se desenvolve rapidamente, pois, as células que sofrem mutação no material genético não conseguem amadurecer como deveriam e permanecem com as características semelhantes a células embrionárias, multiplicando-se de forma rápida e desordenada.
Um fator muito importante que parece predispor ao desenvolvimento de câncer, são as alterações genéticas como a trissomia do 21 (Síndrome de Down), Síndrome de Klinefelter, anemia de Fanconi, entre outras.
Existem alguns tipos de câncer mais comum em crianças, como leucemias, tumores no sistema nervoso central, linfomas, tumores ósseos, entre outros, como veremos a seguir.
Sinais de alerta
Antes de falarmos sobre os tipos de tumores mais comuns na infância e adolescência, existem alguns sintomas gerais que se presentes devem ser traduzidos como sinais de alerta, e busca de atendimento profissional o mais rápido possível.
E que sintomas são esses?
Leucemias
A leucemia é uma doença maligna que afeta os precursores hematopoiéticos que dariam origem à linhagem linfóide ou mieloide. Ocorre que, na medula óssea, uma célula imatura sofre alteração genética e começa a se proliferar rapidamente, dando origem a muitas células anormais e imaturas, os blastos.
Dentre os tipos de leucemia, a mais comum em crianças é a leucemia linfóide aguda (LLA). O pico de incidência se dá entre 2 e 5 anos.
Na LLA, além da alteração dos linfócitos, principalmente o B, ocorre a pancitopenia, ou seja, redução de todas as células sanguíneas – eritrócitos, leucócitos e plaquetas.
O quadro clínico é composto por fadiga, palidez, sangramento, hepatoesplenomegalia, linfadenopatia e cloromas. Nos exames laboratoriais, encontra-se um quadro de anemia, trombocitopenia, neutropenia.
Além desses sinais e sintomas, existem outros importantes e que auxiliam no diagnóstico diferencial da LLA com a LMA (leucemia mieloide aguda). Alguns desses sintomas que podem ser encontrados na LLA são adenomegalia cervical ou generalizada, massa mediastinal, e acometimento do sistema nervoso central e dos testículos.
Felizmente, a LLA quando tratada possui alta chance de cura. O tratamento é realizado com quimioterapia, sendo necessárias 3 etapas: Indução de remissão, consolidação e manutenção.
Durante todo o tratamento, é importante estar atento a possíveis emergências que possam ocorrer, como a neutropenia febril, que ocorre devido a grande deficiência imunológica decorrente do tratamento, predispondo assim à infecções. É um quadro grave que pode levar ao óbito.
Linfomas
Outra condição maligna que pode acometer as crianças são os linfomas, onde ocorre a proliferação desordenada dos linfócitos B ou T presentes nos linfonodos.
Há dois grandes grupos de linfomas: os linfomas Hodgkin e os linfomas não Hodgkin. O grupo mais comum na infância é não Hodgkin.
Os linfomas não Hodgkin são bastante agressivos na infância, desenvolvem-se rapidamente e podem se disseminar de forma extranodal.
Dentre o quadro clínico podem ser notados sinais e sintomas de comprometimento extranodal à distância, como invasão da medula óssea, trato gastrointestinal e sistema nervoso central.
Sendo assim, o quadro pode iniciar com condições de emergência como:
- a síndrome da veia cava superior (ocasionada por tumores que invadem o mediastino anterior e comprimem a veia cava superior, levando a sintomas como pletora da face e palidez, de forma intercalada, edema de face, turgência jugular, cianose, papiledema, pulso paradoxal, dispneia e ortopneia);
- síndrome de lise tumoral (quadro metabólico decorrentes da destruição acelerada de células malignas pela quimioterapia, e essas células liberam seu conteúdo como fosfato, potássio, e os ácidos nucléicos, levando assim a hiperfosfatemia e hipocalemia, hiperpotassemia e hiperuricemia);
- síndrome de compressão medular (cursa com dor local ou com irradiação radicular, fraqueza principalmente em membros inferiores, hiperreflexia tendinosa profunda, e sinal de Babinsky);
- síndrome de hipertensão intracraniana (o aumento da pressão intracraniana leva a alterações do nível de consciência – sonolência ao coma, cefaleia, náuseas e vômitos, crises convulsivas, e pode ocorrer, em casos mais graves, a tríade de Cushing – bradicardia, hipertensão e bradipneia).
O tratamento é realizado com a quimioterapia e com bom prognóstico.
Tumores do Sistema Nervoso Central
Os tumores do sistema nervoso central são também importantes na população pediátrica. Ocorrem pela proliferação desordenada de algum tipo celular como neurônios, células da glia, células das meninges e células do plexo coroide.
Um fator de risco que deve ser lembrado são as síndromes genéticas, como síndrome de Turcot, neurofibromatose tipo 1 e tipo 2, síndrome de Von Hippel Lindau. E também, como fator de risco devemos elencar a exposição à radiação ionizante.
Os mais frequentes são: astrocitomas (o tumor de SNC mais frequente na infância), meduloblastoma, ependimoma, tumores de células germinativas e craniofaringioma.
O quadro clínico é muito variável, pois se dá de acordo com a localização do tumor e idade do paciente. O quadro em lactentes é marcado por macrocefalia, ausência de ganho de peso, vômitos e perda dos marcos de desenvolvimento.
Já as crianças maiores podem apresentar sinais e sintomas variados de acordo com a localização do tumor:
- Tumores na linha média: geralmente cursam com sintomas da Síndrome de hipertensão intracraniana – cefaleia, vômitos, anorexia e perda de peso, irritabilidade, letargia, papiledema e modificações comportamentais e de personalidade.
- Tumores no cerebelo ou em suas vias: Provocam a Síndrome atáxica – marcha de base alargada, disbasia, incoordenação, tremor, disdiadococinesia, dismetria, hipotonia e disartria.
- Tumores comprimindo a via piramidal: espasticidade, hiperreflexia tendinosa profunda, e reflexos patológicos (Sinal de Babinsky e sucedâneos, e Sinal de Hooffman).
- Tumores hemisféricos: pode levar a síndromes convulsivas.
- Tumores no III ventrículo: podem cursar com a síndrome neuroendócrina, como diabetes insipidus, galactorreia, precocidade ou atraso puberal e hipotireoidismo.
- Tumores na região pineal: cursam com a síndrome de Parinaud caracterizada por retração palpebral, incapacidade de realizar a mirada ocular para cima, e reflexos pupilares direto e indireto ausentes.
O tratamento dos tumores é realizado com a cirurgia para ressecção do tumor, radioterapia e quimioterapia.
Neuroblastoma
Além dos tumores do sistema nervoso central, outro tumor que envolve o sistema nervoso é o neuroblastoma, mas agora se trata de uma neoplasia embrionária originada do sistema nervoso simpático periférico.
Ocorre em crianças menores, por volta dos 2 anos, e acomete principalmente meninos e da raça branca.
O quadro clínico varia de acordo com o local acometido. Em geral, provoca uma indisposição nas crianças. Frequentemente encontra-se uma massa abdominal dura, irregular e que atravessa a linha média, e essa se dá pelo acometimento da glândula suprarrenal ou dos gânglios paravertebrais.
Também pode encontrar massas torácicas, e cervicotorácicas (cursando com heterocromia da íris e síndrome de Horner – ptose, miose e exoftalmia). Quando as massas são encontradas na pelve, podem estar comprimindo o intestino e a bexiga, levando a sintomas obstrutivos.
O diagnóstico em grande parte das crianças, quando realizado, já cursa com uma doença avançada e metástases.
O tratamento é realizado com cirurgia em doença localizada. Já em doença avançada, a quimioterapia pode ser realizada, inclusive como neoadjuvante, reduzindo o tamanho da massa tumoral para posterior ressecção cirúrgica.
Tumor de Wilms
O tumor de Wilms origina-se dos tecidos embrionários que formam os rins. A faixa etária mais acometida é entre dois e cinco anos.
O quadro clínico se dá com uma massa abdominal, dura e que não atravessa a linha média. Geralmente não apresenta sintomas, mas por vezes podem ser notados sintomas como dor abdominal, hematúria macroscópica e hipertensão. Ao contrário do neuroblastoma, no tumor de Wilms, as crianças estão mais dispostas.
O tratamento é realizado com a cirurgia seguida de quimioterapia, ou quimioterapia neoajduvante seguida da cirurgia.
O prognóstico após o tratamento é bom, apresentando índices altíssimos de cura.
Rabdomiossarcoma
O rabdomiossarcoma é um tumor que se origina de elementos embrionários do tecido muscular esquelético. As localizações mais frequentes são cabeça e pescoço, seguida do trato genitourinário (em lactentes), e por último, extremidades (crianças maiores).
Geralmente é assintomático, mas podem ser notados sinais e sintomas variados de acordo com a localização.
Os tumores localizados na cabeça e no pescoço frequentemente localizam-se na órbita e assim podem causar proptose, dor, alteração da acuidade visual.
Também podem localizar-se na nasofaringe, região mastóide, fossa infratemporal pterigóide e seios paranasais, levando a sintomas como obstrução nasal e obstrução dos seios paranasais, secreção nasal mucopurulenta e epistaxe.
E ainda, se forem localizados no ouvido médio provocam dor, perda auditiva e otorreia e dependendo da extensão podem comprometer alguns pares cranianos.
Os tumores localizados no trato genitourinário, ocorrem principalmente na próstata e bexiga. Quando localizados na bexiga tende a provocar obstrução e sangramento.
E por fim, os tumores localizados nas extremidades geralmente provocam um aumento do volume e são indolores.
O tratamento é realizado com a ressecção cirúrgica do tumor, radioterapia e quimioterapia.
O prognóstico, principalmente em tumores localizados e ressecáveis, é bom.
Tumores Ósseos
Os tumores ósseos também podem acometer a população infantojuvenil, como o osteossarcoma e o sarcoma de Ewing.
Osteossarcoma
O osteossarcoma acomete principalmente adolescentes durante o “estirão de crescimento”, e é mais comum no sexo masculino.
Origina-se na célula conhecida como ósteon do osso medular, e as células tumorais são caracteristicamente em formato de fuso, pleomórficas e produzem osteoide maligno e osso.
A grande parte acomete a metáfise de ossos longos, sendo alguns locais mais frequentes, como fêmur distal, tíbia proximal e úmero proximal.
O quadro clínico é marcado por dor no local, e geralmente o paciente associa tal dor a algum trauma sofrido. Porém, algumas características da dor chamam a atenção como não responder aos medicamentos e a sua intensidade, que pode despertar o indivíduo durante a noite. Também podem ser notados: limitação de movimento do membro afetado, eritema local, aumento da temperatura e derrames articulares.
O tratamento se baseia em quimioterapia neoadjuvante, cirurgia com ressecção da lesão e novamente a quimioterapia após a cirurgia. O prognóstico é bom nos pacientes com lesão localizada. Aqueles com metástases possuem pior prognóstico.
Sarcoma de Ewing
Outro tumor ósseo que pode afetar a população infantojuvenil é o sarcoma de Ewing, um sarcoma indiferenciado do osso. Pode também se originar em tecidos moles.
Afeta principalmente meninos brancos.
Possuem predileção por algumas áreas como a diáfise dos ossos longos e os ossos planos.
O quadro clínico é bem semelhante ao quadro do osteossarcoma, onde o principal sintoma notado é a dor no local, além de outros achados que podem ser encontrados, como já conversamos anteriormente. Porém, há uma característica muito importante no sarcoma de Ewing, que são as manifestações sistêmicas, como febre e perda ponderal.
Assim como no osteossarcoma, no sarcoma de Ewing o tratamento é realizado com quimioterapia antes da cirurgia, ressecção cirúrgica ou radioterapia, e quimioterapia pós cirúrgica. E o prognóstico também é bom, com altas chances de cura especialmente nos pacientes com lesão localizada.
Retinoblastoma
Um outro tipo de tumor que afeta a população pediátrica e que não podemos deixar de falar é o retinoblastoma, um tumor originado na retina. Grande parte dos casos é unilateral e não são hereditários, mas, existem os casos em que há hereditariedade, e nestes o tumor bilateral se torna mais comum.
O tumor se desenvolve de forma desproporcional ao suprimento vascular, e assim podem ocorrer necrose e calcificação. Esse crescimento acelerado pode culminar em descolamento da retina.
O quadro clínico é caracterizado por leucocoria (reflexo pupilar esbranquiçado). Geralmente, os pais notam que, ao tirar uma foto da criança utilizando o flash não aparece o reflexo vermelho, mas aparece um reflexo branco (como “olho de gato”). Além da leucocoria, pode ocorrer o estrabismo.
Para o tratamento existem diversas abordagens que visam primariamente conservar a vida e secundariamente conservar a visão. Pode ser realizada a fotocoagulação com laser ou crioterapia, quimioterapia, e em casos mais graves, a enucleação (remoção do globo ocular).
Concluindo..
Assim, é importante estar cada vez mais atento aos sinais do câncer infantil para que o diagnóstico seja realizado o mais precocemente possível, assim como o início do tratamento. Vimos hoje alguns tumores mais comuns nessa população, e conhecê-los se faz de suma importância para o melhor atendimento e apoio às crianças e adolescentes acometidos.
O dia do combate ao câncer infantil visa trazer essa conscientização da importância de estar atento à doença, promover debates, avanço técnico científico, para que a abordagem seja integral, atendendo da melhor forma esses pacientes e dando todo o apoio necessário para vencer a doença.