As crianças são mais suscetíveis à desidratação do que os adultos, visto que possuem um maior percentual de água corporal total, há uma maior área de superfície corporal, principalmente em crianças menores e lactentes, e ocorre com maior incidência as doenças diarreicas agudas. Quando nos deparamos com uma criança com um quadro de diarreia há menos de 14 dias, definimos esse quadro como uma Diarreia aguda. Essa se constitui uma importante causa de mortalidade infantil, apesar de que nas últimas duas décadas, segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), ter ocorrido uma expressiva queda nessa mortalidade por doenças diarreicas infecciosas. por isso, é importante saber avaliar o nível de hidratação clinicamente e instaurar uma terapêutica adequada o mais precocemente possível.
Podemos dividir nossa avaliação do estado de hidratação em A, B, e C, segundo proposta da OMS e adotada pelo Ministério da Saúde, como demonstrada em tabela abaixo:
Avaliação do estado de Hidratação
Plano A
No plano A, em uma criança sem sinais de desidratação, o tratamento deve ser feito intradomiciliar, através de uma oferta maior de líquidos sejam caseiros ou o Soro de Reidratação Oral (SRO) e manter alimentação. Além disso, indica-se a administração de zinco, a fim de melhorar a inflamação do epitélio intestinal e fortalecer o sistema imune. Deve-se orientar sobre a identificação de sinais de alerta, e sobre o retorno à unidade se presentes ou se não apresentar melhora em dois dias.
E quais são esses sinais de alerta?
- Piora na diarreia;
- Vômitos repetidos;
- Muita sede;
- Recusa de alimentos;
- Sangue nas fezes;
- Diminuição da diurese.
Plano B
Já no Plano B essa criança encontra-se desidratada, e é importante realizar a reposição com SRO sob supervisão médica na unidade de saúde. Oferta à criança de forma frequente entre 50 a 100 mL/Kg do SRO, durante 2 a 4 horas. Após esse período, reclassifica essa criança e deve-se tratá-la de acordo.
Plano C
Quando o paciente chega ou evolui com desidratação grave é o momento em que devemos pensar em métodos mais invasivos para terapia de reidratação. Ela ocorre por via parenteral e possui duas fases: a de EXPANSÃO, e a de MANUTENÇÃO e REPOSIÇÃO.
Indicações de Terapia Venosa:
- Desidratação grave (perda ponderal > ou igual a 10%);
- Contraindicações de hidratação oral (íleo paralítico, abdômen agudo, alteração do nível de consciência ou convulsões);
- Choque hipovolêmico.
Indicações de Internação Hospitalar (ESPGHAN, 2014):
- Choque hipovolêmico
- Desidratação grave (perda de peso maior ou igual a 10%)
- Manifestações neurológicas
- Vômitos biliosos ou de difícil controle
- Falha na Terapia de Reidratação Oral (TRO)
- Suspeita de doença cirúrgica associada ou falta de condições satisfatórias para tratamento domiciliar ou acompanhamento ambulatorial
O tipo de solução cristaloide a ser utilizada, e as quantidades variam de acordo com a literatura. Segundo recomendações do MS, temos:
Fase rápida EXPANSÃO:
< 5 anos: Soro Fisiológico a 0,9% (SF 0,9%) à 20 mL/kg a cada 30 minutos. Repetir até que a criança fique hidratada;
> 5 anos SF 0,9%, 30 mL/kg em 30 minutos + Ringer lactato, 70 mL/kg em 2,5 horas
Fase de MANUTENÇÃO E REPOSIÇÃO (qualquer idade):
Soro Glicosado a 5% + Soro Fisiológico na proporção 4:1 (volume da regra de Holiday& Segar + KCl 10% 2 mL para cada 100 mL de solução da fase de manutenção.
Fase reposição: Soro Glicosado a 5% + Soro Fisiológico partes iguais 1:1
Iniciar com 50 mL/kg/dia Reavaliar de acordo com as perdas diarreicas
Regra de Holiday & Segar (Taxa hídrica diária):
- Peso corporal de até 10 kg: 100 mL/kg;
- Peso corporal entre 10 e 20 kg: 1000 mL + 50mL por quilo acima dos 10 kg;
- Peso corporal superior a 20 kg: 1500 mL + 20mL por quilo que ultrapassar os 20 quilos.
Quando podemos avaliar uma alta hospitalar?
Para isso, o paciente deve manter-se hidratado com a hidratação por via oral reestabelecida.
O ínicio da SRO se dá quando o paciente progride com melhora do quadro clínico e passa a aceitar líquidos, e aos poucos deve-se aumentar até que ingira em quantidade suficiente para manutenção de sua necessidade hídrica. Nesse momento podemos suspender a terapia de reidratação endovenosa. Mantemos essa criança por observação por 6 horas, e caso mantenham-se estáveis, podemos pensar na alta hospitalar.
Lembrando que nesse post abordamos apenas a questão da Desidratação na Pediatria. É importante também sabermos abordar os quadros infecciosos diarreicos, identificar seus agentes, saber quais indicações de antibioticoterapia e de outros medicamentos.