Introdução:
Durante a nossa caminhada pela cirurgia geral, nós ouvimos falar muito em uma técnica cirúrgica utilizada para o tratamento de alguns tipos de câncer no estômago, que é a técnica em Y de Roux. Mas de onde veio esse nome “Y de Roux”?! Já parou para pensar que, por trás desse epônimo, existiu um ser humano que batalhou para alcançar os seus objetivos, além de contribuir com grandes e variados trabalhos para a Medicina do Brasil e do mundo? Pois esse ser humano foi o César Roux. Neste artigo, você irá conhecer um pouco mais de sua história e como foi a sua caminhada até descobrir essa brilhante técnica utilizada por milhares de cirurgiões gerais, e que otimizou em uma porcentagem imensa o sucesso na cirurgia desses pacientes.
César Roux:
César Roux nasceu em 23 de março de 1857, no município de Mont-la-Ville, na Suíça. Ele foi o primogênito de uma geração de 11 irmãos, todos eles imigrantes de huguenotes franceses (protestantes), que chegaram à Suíça após uma grande migração, que ocorreu no século XVII. Seu pai era professor e também trabalhava como inspetor de uma escola nas proximidades de onde moravam. Ele foi um exemplo de determinação para que César mergulhasse de cabeça em seus estudos. O relator da técnica em Y de Roux estudou em um colégio em Mont-la-Ville e, inicialmente, optou por cursar a carreira de médico veterinário. Mas, foi com a influência de um médico renomado de sua aldeia, decidiu cursar a faculdade de Medicina. Ele se formou em Medicina na Universidade de Berna, também na Suíça, no ano de 1880. Após receber o seu diploma, César continuou a sua caminhada pela pacata cidade aonde se formara e começou a trabalhar como assistente de Theodor Kocher, um fisiologista alemão bastante renomado e dono de um dos prêmios Nobel de Medicina. No magistério, iniciou a sua carreira em 1885, quando aceitou o cargo para ser professor na área da medicina forense da Academia de Lausanne. Posteriormente, quando a Academia de Lausanne virou, enfim, uma Universidade, César Roux assumiu o cargo de diretor da clínica cirúrgica da faculdade. Após 7 anos trabalhando como assistente de Theodor e observando como o departamento funcionava, César assumiu o cargo de chefe dos departamentos de cirurgia no Hospital Cantonal, em Lausanne, cidade localizada na Suíça.
Na Medicina:
Durante os anos em que passou estudando para se tornar médico, o descobrir da técnica do Y de Roux aprimorou os seus estudos, sendo monitor de anatomia patológica, inclusive foi visitar diversas clínicas cirúrgicas na Áustria. Porém, o seu destino já estava sendo traçado. A essa época, César já havia começado a escrever a sua tese de doutorado, que contava em detalhes os seus estudos sobre a musculatura esfincteriana anal, trabalho este que o auxiliou no desenvolvimento de suas habilidades médico-cirúrgicas.
Ele sempre se mostrou muito interessado nas especialidades cirúrgicas, tanto que durante a sua graduação, escreveu artigos sobre os danos dos meniscos do joelho, e também sobre as diversas formas de apresentação das artrites. Além disso, estudos sobre as diferentes formas de apresentação da tuberculose também receberam o seu nome. Alguns procedimentos também foram descritos com a sua ajuda, como os procedimentos sobre a osteomielite e sobre as técnicas cirúrgicas de prostatectomia.
Apesar de todo o seu esforço em expandir o seu conhecimento para outras áreas que não a cirurgia geral, César Roux não conseguiu escapar por muito tempo. Seu trabalho de maior destaque foi acerca das cirurgias abdominais. Devido a esse interesse, foi capaz de desenvolver uma técnica cirúrgica para chamar de sua, técnica esta que recebeu o seu nome como reconhecimento de todo o seu trabalho.
Y de Roux:
Inicialmente, o sobrenome de César Roux foi utilizado como forma de agradecimento pelo trabalho de Roux, que teve enorme importância na obstrução antepilórica e que chamou a atenção de diversos cirurgiões no século XIX. A nova técnica, no início de sua implementação, possuía uma mortalidade de 21%, percentual este que vinha em declínio ao decorrer dos anos e, com o aumento da prática dos cirurgiões, caiu para 11%. César também acompanhou os seus pacientes oncológicos, constatando que todos eles juntos contribuíram para um aumento da expectativa de vida desses doentes com mais 7 anos e meio.
A técnica descrita por César Roux é, atualmente, a técnica mais utilizada no tratamento das gastroplastias no mundo, por ser uma técnica que providenciou um aumento na qualidade de vida dos pacientes, obtendo resultados espetaculares. Mas como ela é feita? Inicialmente, pega-se um grampeador e divide-se o estomago do paciente em duas partes, de modo que a quantidade de alimento que chegará a esse estomago, posteriormente, fique limitada. Em segundo lugar, o cirurgião irá pegar o segmento inicial desse estomago que foi repartido e fazer uma ligação direta com o intestino. O segmento que estiver sobrando será ligado lateralmente nesse intestino, formando o Y de Roux. Ou seja, ela foi idealizada como uma maneira de separar o conteúdo proveniente do intestino, daquele conteúdo biliopancreatico, fazendo uma forma de derivação. Foi chamado de “Y” devido ao seu aspecto final, que era semelhante a esta letra do alfabeto.
É uma técnica amplamente utilizada por cirurgiões em diversos procedimentos cirúrgicos do aparelho digestivo, como por exemplo na gastrectomia, derivação biliodigestiva, by-pass gástrico, entre outros. César Roux descreveu naquela época que a técnica devia ser feita com uma alça de 12 cm em média, porém isso com o aprimoramento da técnica, caiu por terra. Estima-se que o comprimento dessa alça deva ser de 50-60 cm para possuir resultados satisfatórios e evitar complicações provenientes da cirurgia, como o refluxo biliar.
Além da Medicina:
Como já falado anteriormente, não foi somente na área cirúrgica, tampouco na área médica, que o desenvolvedor da técnica em Y de Roux se limitou. César realizou intensos trabalhos além dessa área, como, por exemplo, o que ocorreu no ano de 1906. Nessa época, ele viu-se preso em um dilema: havia uma criança que sofreu queimadura por soda caustica em seu esôfago. Como tratamento, não haviam muitas opções terapêuticas e, as que estavam disponíveis, colocariam esse pequeno jovem em grande risco de complicações que poderiam ser até mesmo fatais. Foi aí que César tomou a liderança e decidiu fazer o que chamou de esofagojejunogastroanastomose, reconstruindo todo o esôfago desse paciente com o jejuno. Esse procedimento forneceu mais uns bons anos de vida ao paciente, que estava condenado a ter complicações devido aos outros procedimentos indicados.
Conclusão:
A iatrogenia quer fazer referência a um estado de doença, efeitos adversos ou complicações que foram geradas como resultado de algum tratamento médico. Era isso que acontecia antes da mente brilhante de César Roux entrar em campo. Vários pacientes que necessitavam de uma gastroplastia, independente de sua causa, sofriam com um pós-operatório regado de complicações, além de viverem menos e com uma qualidade de vida inferior as que tem hoje. Portanto, a existência de um homem capaz de desenvolver essa técnica cirúrgica foi de grande valia para a melhora clínica do paciente, assim como estabelecer um melhor prognostico para esses indivíduos. César Roux fez história e continua eternizado em cada paciente que recebeu uma anastomose em Y de Roux. Sendo assim, nós devemos sempre olhar os epônimos como um todo, afim de prestigiar os médicos que descobriram tais estruturas ou sinais semiológicos, dando o valor que eles merecem.