Aspectos gerais do hantavírus
Os Hantavírus são vírus envelopados, contendo três segmentos de RNA e são responsáveis por viroses hemorrágicas não arbovíricas, ou seja, que não são transmitidas por artrópodes, como a dengue.
A Hantavirose, doença causada por esses vírus, é de notificação compulsória. No entanto, apesar de ter alta letalidade, ainda é subnotificada no nosso país.
Foi descrita pela primeira vez nos Estados Unidos em 1993, causada por um microrganismo que recebeu o nome de hantavírus Sin Nombre (HSN).
Ainda assim, a identificação e o tratamento dessa infecção são deficientes. Então, vamos conhecê-la melhor?
Aspectos epidemiológicos do hantavírus
Os reservatórios naturais desses vírus são os roedores silvestres infectados, que não desenvolvem a doença, porém eliminam as partículas virais por meio das fezes, urina e saliva.
No Brasil, os principais são as espécies Necromys laziurus (conhecido como “ratinho do cerrado” ou “pixuna” ou “rato do rabo peludo” – é um roedor presente na América do Sul, com hábitos diurnos, se alimenta de sementes e insetos, habitando as regiões do cerrado e caatinga brasileira) e Oligoryzomys sp. (espécies de roedores neotropicais, distribuídas pela América Latina – no Brasil, existem doze espécies desse gênero, conhecidas como “rato do mato”).
Nesses animais, os hantavírus ficam alojados nas células endoteliais, pulmonares e renais. Inquéritos sorológicos têm indicado que as infecções podem ser relativamente frequentes, porém o número de casos notificados ainda é menor do que a sua real ocorrência.
A ocorrência de surtos ou de casos isolados da doença no Brasil, até o momento, parece estar relacionada a algumas situações particulares e alguns fatores ambientais de risco, tais como: o perfil agrícola nos estados acometidos (aproximando os reservatórios naturais); construção de paióis para estocagem de ração ou grãos (o que atrai os roedores silvestres); manejo da lavoura do milho; desmatamento associado à quase extinção dos predadores naturais dos roedores (por exemplo: cobras, gaviões e corujas); áreas de reflorestamento com pinus ou eucaliptos, como foi observado no Paraná; e a urbanização de áreas rurais, onde se pode observar a presença de bairros localizados próximos a matas.
Transmissão
A transmissão se dá principalmente pela inalação de aerossóis liberados nas excretas dos roedores reservatórios. Outras possíveis formas seriam: i) transmissão pessoa a pessoa (causada pelo sorotipo Andes hantavírus, menos frequente no Brasil); ii) através de água e alimentos contaminados; iii) por meio de escoriações e mordidas.
Formas clínicas
A doença ocorre sob duas formas clínicas potencialmente letais: Febre Hemorrágica com Síndrome Renal (FHSR), muito comum na Europa e Ásia; e Síndrome Cardiopulmonar por Hantavírus (SCPH) ou Síndrome Cardiopulmonar e Vascular, mais comum no Brasil e no continente americano.
Ambas possuem uma taxa de mortalidade que varia de 40% a 60%. O período de incubação estimado é de 3 a 60 dias, com média aproximada de 15 dias.
A sintomatologia inicial da Hantavirose é muito semelhante às viroses no geral, com a presença de febre, dores musculares (mialgia), cefaleia (dor de cabeça) e astenia (mal-estar) — fazendo com que seja facilmente confundida com uma gripe forte ou uma pneumonia.
Entretanto, o quadro pode agravar-se rapidamente, evoluindo para insuficiência respiratória aguda, comprometimento cardiovascular e instabilidade hemodinâmica e hipotensão, que culmina com choque circulatório e leva ao óbito em 4 a 24 horas, mesmo em indivíduos hospitalizados.
Manifestações clínicas da SCPH
A doença se inicia abruptamente com uma fase febril que tem duração de 3 a 6 dias (muito semelhante às arboviroses, fazendo diagnóstico diferencial).
A febre geralmente se apresenta com temperaturas elevadas, acima de 38ºC, associada a sintomas sistêmicos, como: mialgia, náusea, diarreia, vômito, dor abdominal, tosse – que podem estar todos ou apenas alguns presentes.
Posteriormente à fase febril ocorrem alterações respiratórias e cardiocirculatórias, que de fato a diferem das outras síndromes febris:
- Respiratórias: dispneia (falta de ar), taquipneia (respiração acelerada) e tosse, que evoluem para um quadro de insuficiência respiratória aguda e edema pulmonar. O acometimento dos pulmões decorre da infecção de células endoteliais microvasculares pulmonares, o que acarreta o aumento da permeabilidade (pela ação de citocinas) e, consequentemente, derrame (acúmulo) de fluidos.
- Cardiocirculatórias: taquicardia (batimentos cardíacos acelerados) e hipotensão (queda da pressão arterial), que evoluem para colapso cardiocirculatório e, podendo culminar em choque.
Habitualmente, se observa trombocitopenia (diminuição na quantidade de plaquetas) e hemoconcentração (diminuição do volume de plasma, sem alteração no número de hemácias).
Diagnóstico laboratorial
São utilizados Sorologia (IFI – Imunoflurescência Indireta ou ELISA por captura de IgM) e Testes moleculares (RT-PCR) para confirmar laboratorialmente as Hantaviroses.
O isolamento viral só é utilizado e viável em centros de referência em pesquisas dessa área.
Tratamento do hantavírus
Não existem vacinas ou antivirais específicos contra os hantavírus. O tratamento disponível é o de suporte para controle das funções hemodinâmicas e manutenção da oxigenação.
Recomenda-se a admissão imediata em centros de terapia intensiva (CTI), com oxigênio, suporte ventilatório, reposição hídrica e drogas para manejo do choque.
Prevenção do hantavírus
Como a transmissão para humanos está principalmente associada à exposição aos dejetos dos roedores silvestres infectados, as medidas de prevenção e controle se baseiam na redução desse contato.
Tendo enfoque nos ambientes potencialmente contaminados, como habitações que possam servir de tocas e ninhos para esses animais, bem como estocando corretamente alimentos que poderiam ser consumidos por eles.
Vale ressaltar que a eliminação dos roedores é inviável e incorreta, uma vez que geraria um grande dano ecológico.
Além disso, o uso de EPIs (Equipamentos de Proteção Individual) por técnicos ou por qualquer outro indivíduo que ingressar em locais fechados passíveis de contaminação, como: proteção respiratória (máscara ou respiradores com filtros de maior eficiência – PFF3) e luvas de borracha para manipulação de roedores mortos, objetos ou alimentos contaminados.
Limpeza dos locais potencialmente contaminados, seguindo as seguintes etapas:
– abrir portas / janelas das habitações, silos, paóis, etc – por no mínimo 30 min;
– umedecer pisos, paredes, utensílios, roedores mortos ou sinais de excretas – com água sanitária 10% ou detergente, para impedir a dispersão dos aerossóis;
– aguardar ≥ 30 min, antes de começar a limpeza (sempre com o ambiente úmido, nunca seco).
No caso de suspeita de contaminação de alimentos, os mesmos devem ser molhados previamente com desinfetante e enterrados numa profundidade ≥ 50cm.
Bons estudos e até o próximo artigo!