O retorno às aulas após férias com exposição ao sol, idas à praia, requer uma atenção especial com as crianças. A Sociedade Brasileira de Dermatologia Dermatologia listou as principais doenças de pele nas crianças após as férias, as quais podem ser transmitidos durante o contato com outras crianças no ambiente escolar. Visto a importância desse tema, nesse artigo serão abordadas algumas dessas doenças listadas e, além disso, outras doenças que são frequentemente encontradas no atendimento pediátrico.
Pediculose
Piolho, bastante conhecido pelos familiares de crianças, é uma temida infecção parasitária que atinge crianças de todos os estratos sociais, não é restrita às comunidades carentes. Há dois tipos de piolhos da família Pediculidae que infestam o ser humano: o piolho do corpo Pediculus humanus corporis e o piolho da cabeça Pediculus humanus capitis.
O piolho da cabeça é resistente a variação de temperatura, deposita lêndeas próximo as raízes dos cabelos, presos por uma substância gelatinosa que se solidifica em minutos. As regiões do couro cabeludo mais afetadas são occipital e auricular posterior, onde o prurido é mais intenso, logo, sempre deve-se buscar pediculose em crianças que coçam a cabeça. No entanto, há crianças que são pouco sensíveis às picadas dos piolhos (sub-sintomáticas ou assintomáticas). Não manifestam o prurido e acabam tendo grande infestação, servindo de foco de disseminação aos colegas.
Infecções dermatológicas secundárias mais comuns: impetigo, furunculose e infartamento dos linfonodos correspondentes.
Transmissão: Contágio direto, pelo convívio com pessoas parasitadas, ou indireto pelo uso de bonés, tiara, toalhas ou roupas de cama.
Tratamento não medicamentoso: Penteação. Isto evitará que uma pessoa da casa ou da escola funcione como foco do parasita e provoque novas infestações. Além disso, segundo a SBD, deve-se lavar com água em temperatura acima de 50 graus todas as roupas e utensílios pessoais de pano e/ou secados em máquina de secar roupas nas mais altas configurações de calor.
Tratamento medicamentoso:
Tratamento tópico:
– Permetrina 1% (emulsão ou loção 60 mL): Lavar os cabelos com shampoo normal (não usar condicionador) e secar com o auxílio de uma toalha. Aplicar o produto no cabelo todo, deixar agir por 10 minutos e enxaguar com água morna. Não lavar o cabelo pelas próximas 24 a 48h. Deve-se repetir o tratamento no nono dia.
A permetrina pode ser usada a partir dos 2 meses de idade e seu uso é seguro na gestação.
Tratamento sistêmico:
– Ivermectina: A eficácia da ivermectina via oral no tratamento da pediculose, incluindo os casos resistentes foi demonstrada em vários estudos. Cada comprimido contém 6 mg de ivermectina e devem ser ingeridos com água.
Pitiríase
É uma ceratofitose da camada córnea da epiderme causada pelo fungo Malassezia spp. É uma das importantes doenças de pele após as férias por ser mais prevalente em lugares com clima quente e úmido. É comum em adolescentes pós-puberdade por ser uma levedura lipofílica da flora normal da pele, e o aumento lipídico pós puberdade destaca tal quadro. É assintomática e surge após exposição solar. O nome versicolor dá-se por manchas discrômicas na pele.
Clínica:
– Máculas com descamação furfurácea de cor variável
– Acastanhadas (fototipo baixo – pele clara) comuns em coxa, hipocrômicas e café com leite (fototipo alto – pele morena) ou eritematosas.
– Sinal da unha; Sinal de “Zirelli”: A descamação fica mais evidente ao se passar a unha na lesão (sinal da unha) ou realizar estiramento da pele (sinal de Zirelli)
Topografia: couro cabeludo e regiões com grande quantidade de glândulas sebáceas (face, pescoço e tronco superior) exceto região palmar e plantar.
Diagnóstico:
– Exame direto: pseudo hifas e blastonídeos
– Cultura: em meio especial com azeite de oliva
– Luz de Wood: fluorescência rósea-dourada
– Tratamento tópico: Aplicar em todo o tronco, pescoço, braços e coxas (mesmo em pacientes com poucas lesões) até o joelho.
Cremes ou loções 1 a 2 vezes ao dia por 7 a 15 dias.
Shampoos em dias alternados ou diariamente por 7 a 15 dias.
– Tópicos:
Tolciclato
Flutrimazol
Bifonazol
Cetoconazol
Clotrimazol
– Sistêmicos:
Cetoconazol 200mg/dia
Itraconazol 100mg/dia
Fluconazol 150 – 300mg/semana
– Duração: 2 a 4 semanas
Molusco
Molusco Contagioso é uma infecção viral cutânea muito frequente, causada por um vírus com dupla cadeia de ácido desoxirribonucleico, pertencente à família dos poxvírus, gênero Molluscipox. A faixa etária mais acometida são crianças de 1 a 14 anos, sendo menos comum em menores de 1 ano por imunização materna.
– Pápulas cor da pele, entre três a cinco milímetros de diâmetro, por vezes chegando a três centímetros (“molusco gigante”). As lesões normalmente apresentam uma umbilicação central de onde pode ser drenada uma substância branco-acinzentada extremamente virulenta. Tem como diagnóstico diferencial verrugas vulgares, foliculite, xantogranuloma infantil e nevo de Spitz.
Transmissão: O contato direto é a forma de contágio mais comum que existe para esse tipo de infecção. Mais comum de ocorrer em pessoas já com o sistema imunológico comprometido, como no caso de soropositivos, e em crianças, especialmente as que têm a pele seca, e alérgicas, como na dermatite atópica.
– As lesões são comumente encontradas no tronco, podendo, contudo, ocorrer em qualquer parte da pele. As pápulas podem ocorrer em forma de linha. São autoinoculáveis que surgem principalmente nas áreas de trauma, provavelmente de coçadura.
– Em adultos, vale ressaltar que é comum que essas lesões sejam vistas nos órgãos genitais, abdômen, e parte interna das coxas, e então serem consideradas por alguns autores como DST.
Tratamento:
– Remoção física: curetagem, criocirurgia, laserterapia ou eletrocauterização
– Irritantes tópicos: ácido tricloroacético, cantaridina, tretinoína, tazaroteno.
A maioria das lesões é autolimitada, mas podem permanecer por 2 a 3 anos. Indica-se o tratamento por questões estéticas ou prevenir a disseminação. Tratamentos que causam dor mínima, como os irritantes tópicos, devem ser usados primeiro sobretudo em crianças.
As crianças podem continuar frequentando escolas ou creches. No entanto, suas lesões devem ser cobertas para reduzir o risco de disseminação.
Larva migrans
Larva migrans, também conhecida como bicho geográfico, é uma infecção que atinge tanto adultos quanto crianças pela característica menos espessa da pele nessa faixa etária. Surgem em decorrência do contato direto da pele com areia na qual estejam presentes larvas de parasitas do gênero Ancylostoma. Comumente caixas de areias de parques infantis ou outros locais arenosos que foram previamente frequentados por cães e gatos também infestados, porém no tubo digestivo por vermes adultos que liberam ovos que vêm a ser depositados na areia.
Embora seja uma infecção normalmente autolimitada com duração aproximada de duas a oito semanas, o tratamento normalmente se faz necessário para alívio do prurido e redução da chance de infecção secundária.
Tratamento: Ivermectina oral para adultos e crianças com mais de 15kg. A dose única de 200mcg/kg é bastante efetiva, e há melhora dos sintomas em 7 dias. Em caso de indisponibilidade da Ivermectina, o tratamento alternativo é com albendazol. Em crianças acima de 2 anos a dose é de 10 a 15mg/kg/dia (dose máxima de 800mg/dia) por 3 dias. Há contraindicação do uso em crianças menores de 2 anos.
Impetigo
Infecção bacteriana comum da pele, superficial, provocada por Staphylococcus aureus, Streptococcus ou por ambas.
Faixa etária: crianças em idade pré-escolar, entre os 2 e os 5 anos de idade, especialmente nos meses mais quentes e úmidos do ano e em ambientes com condições de higiene deficiente. Por isso é uma das doenças de pele mais comuns após as férias.
O impetigo é dividido em dois tipos clínicos: o bolhoso e o não-bolhoso ou crostoso.
O impetigo bolhoso é quase universalmente causado por um único organismo, S.aureus, que é produtor de uma toxina epidermolítica. Inicia-se com pequenas vesículas que se transformam em bolhas flácidas de até 2 cm de diâmetro, com o conteúdo inicialmente límpido, passando a turvo posteriormente. O teto da bolha rompe-se facilmente, revelando uma base eritematosa, brilhante e úmida. O remanescente do teto da bolha pode ser visto na periferia como um colarete e a confluência de lesões leva ao aparecimento de figuras policíclicas. A face é o local mais afetado, embora qualquer região da pele possa ser atingida, inclusive palmas e plantas. Linfadenomegalia regional está habitualmente ausente. Apresenta uma importância especial no período neonatal, ocorrendo comumente após a segunda semana de vida, podendo estar presente ao nascimento no caso de ruptura prematura de membranas. O impetigo bolhoso é o mais comum entre crianças de 2 a 5 anos.
O impetigo não-bolhoso (crostoso) representa mais de 70% dos casos de impetigo e ocorre em crianças e adultos, mas raramente ocorre em menores de 2 anos de idade. Nos estudos realizados na última década houve um ressurgimento de S.aureus como o principal agente do impetigo crostoso. Pode ocorrer em pele normal ou a impetiginização pode surgir sobre dermatose prévia como dermatite atópica, dermatite de contato, picadas de inseto, pediculose e escabiose. A desnutrição e higiene precária são fatores predisponentes. A lesão inicial é uma vesícula, sobre uma base eritematosa que se rompe com facilidade. A ulceração superficial resultante logo é recoberta por secreção purulenta cujo ressecamento dá origem a uma crosta aderente e amarelada (melicérica). Cada lesão mede de 1 a 2 cm de diâmetro, cresce centrifugamente, nem sempre com cicatrização central. É freqüente o achado de lesões satélites por autoinoculação. Há um predomínio de lesões nas áreas expostas, especialmente na face, ao redor do nariz e da boca. A linfadenopatia regional é comum e pode surgir febre nos casos mais graves.
Transmissão: O contágio pode ocorrer através do contato direto com feridas ou gotículas da secreção nasal das crianças infectadas ou ainda por objetos pessoais contaminados (roupas pessoais, de cama, de banho, brinquedos). A disseminação da doença faz-se por autoinoculação (na mesma criança) e heteroinoculação (contacto com outras crianças). São frequentes surtos em creches e escolas.
Período de incubação: 4 a 10 dias
Tratamento:
– Cuidados gerais: manter o local afetado limpo, lavando-o com água e um sabão anti-séptico (triclosan, irgarsan, clorexidina ou iodo povidona), remover crostas e secreções, usando compressas de água morna e sabão ou soluções antissépticas como o permanganato de potássio
– Indicações para tratamento com antibiótico sistêmico: acometimento de estruturas mais profundas (tecido subcutâneo, fáscia muscular), febre, linfadenomegalia, faringite associada, infecções próximas à cavidade oral uma vez que a criança pode retirar a medicação tópica com a boca, infecções no couro cabeludo, pela dificuldade do uso de cremes ou pomadas no local, lesões numerosas (mais de 5 lesões).
– Tratamento tópico: Mupirocina, aplicada 3 vezes por dia, é o antibiótico tópico de escolha. A segunda escolha fica para o ácido fusídico e a terceira para a associação de neomicina e bacitracina.
– Antibioticoterapia sistêmica: deve cobrir estafilococos e estreptococos, tanto para o impetigo bolhoso quanto para o impetigo crostoso. Existem várias opções de antibiótico e listamos abaixo algumas delas.
– Penicilina benzatina
– Cefalosporinas de primeira geração, como a cefalexina e o cefadroxil, são os antibióticos de primeira escolha: – cefalexina: 25-50 mg/kg/dia; 6/6 horas, VO, 7-10 dias – cefadroxil: 30 mg/kg/dia; 12/12horas, VO, 7-10 dias;
– Eritromicina – por ser mais barata, torna-se o antibiótico de primeira escolha para as populações mais carentes. Deve-se levar em consideração a possibilidade de resistência de S.aureus, que ocorre em uma taxa de 10% a 52%, dependendo da população estudada; – 30 – 50 mg/kg/dia; 6/6 horas, VO, 7-10 dias;
Outros macrolídeos como a claritromicina, roxitromicina, azitromicina apresentam como vantagem menor número de efeitos colaterais no trato gastrointestinal e posologia mais cômoda, mas como desvantagem custo maior que a eritromicina.
– Amoxacilina + ácido clavulânico – a associação de uma penicilina com um agente inibidor da betalactamase (ácido clavulânico) permite uma cobertura adequada aos estreptococos e aos estafilococos; – para a formulação 7:1 (amoxacilina-clavulanato) – 45 mg/kg/dia, 12/12 horas, VO, 7-10 dias.
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