O raciocínio clínico é considerado uma das principais “artes” da ciência médica e deve ser constantemente valorizada como tal. O bom raciocínio clínico é capaz de identificar doenças, conhecer o paciente, propor a melhor intervenção terapêutica e estabelecer a possível evolução e prognóstico do que estamos lidando. É como se estivéssemos à busca das peças de um quebra-cabeça.
As principais etapas são a anamnese (coleta de dados que vai orientar a base do raciocínio diagnóstico; aquisição de informações visualizadas no exame clínico, correlacionando-se com os sinais e sintomas descritos anteriormente; valorização de cada dado semiótico e estabelecimento de hipótese diagnóstica – com a utilização ou não de métodos complementares – até a confirmação da suspeita diagnóstica).
SERÁ QUE APRENDEMOS CORRETAMENTE?
Atualmente, há algumas críticas no modelo tradicional que os estudantes de Medicina aprendem o raciocínio clínico. Na maioria das vezes, o início do aprendizado ocorre com a passagem da “técnica” da coleta de dados clínicos do paciente (anamnese), sem uma preocupação diagnóstica e/ou terapêutica inicialmente.
Logo em seguida, aprendemos a examinar o paciente de maneira praticamente robótica, um passo a passo, muitas vezes seguindo um roteiro impresso (se por um lado isso facilita de forma didática, não reflete diretamente a realidade da prática médica). Então, após todo esse trabalho fragmentado e por etapas, o estudante começa a elaborar possíveis hipóteses.
No entanto, os médicos fazem isso de forma segmentada? Se parar para pensar um pouco, na verdade não! O profissional médico, principalmente aquele que sabe montar bem um raciocínio clínico, cumpre essa tarefa de forma muito mais dinâmica e contínua.
Com a famosa ectoscopia e logo após a queixa principal, o médico já está montando de forma instantânea um raciocínio clínico que possa guiá-lo até possíveis hipóteses diagnósticas e formas de intervenção, além de estar refletindo sobre os possíveis prognósticos.
Ao evoluir no acúmulo de informações, integra, conecta e desconecta, faz “links” com os conhecimentos já armazenados em sua memória, a fim de enriquecer ou enfraquecer as hipóteses já formadas.
Por exemplo, ao adentrar à porta do consultório um paciente com quadro de edema generalizado, o médico já poderá pensar que existe provavelmente um acometimento cardíaco, hepático ou renal. Com o ganho de informações da história, do exame físico, o raciocínio vai se construindo, e uma hipótese ganha força em detrimento da outra.
Se após um tempo, o paciente refere dispneia e palpitações, talvez a causa cardíaca seja a principal suspeita. Se há relatos de muita espuma na urina… (“Será que o paciente tem proteinúria e a causa é renal?”) e assim vai! É um ritual mental constante, flexível, dinâmico, de investigação.
Óbvio que, infelizmente, isso ocorre com o tempo, e algumas técnicas de aprendizado são difíceis de transformar. Por exemplo, o primeiro passo deve, sim, ser o ensino da técnica da anamnese.
No início, os alunos ficam um pouco frustrados porque coletam uma gama enorme de informações e muitas vezes não são capazes de criar hipóteses diagnósticas, não conseguem filtrar a importância de cada uma delas.
Essa etapa logo é vencida (para a felicidade dos acadêmicos)! Daí, parte-se para a segunda etapa que é montar, a partir dos conhecimentos anatomopatológicos e fisiopatológicos, a correlação dessas informações com os sinais / sintomas descritos pelos pacientes.
Uma metáfora muito utilizada para essa fase é a de um quebra cabeça, em que sabemos em qual figura queremos chegar e vamos tentando achar as peças para encaixá-las perfeitamente.
Com o passar dos anos e com a experiência digna de médicos já vividos e que possuem a arte do raciocínio clínico em suas veias, alcançamos a terceira etapa. O raciocínio diagnóstico começa a caminhar lado a lado com a obtenção dos próprios dados. A cada história contada pelo paciente, hipóteses diagnósticas ganham ou perdem força na mente do profissional médico.
Vale a pena lembrar que nem sempre se chega a uma hipótese diagnóstica consistente (apesar de sabermos que com uma anamnese e um exame físico bem realizados, mais de 80% dos diagnósticos são feitos sem outros métodos). Nesse ponto que, já com algumas suspeitas em vista, o exame complementar ganha grande destaque.
Assim, outra habilidade deve ser desenvolvida, ainda mais na Medicina moderna, a de saber qual exame complementar escolher (nem sempre é uma tarefa fácil, ainda mais nos dias de hoje em que temos uma gama infinita de métodos para nos auxiliar no diagnóstico).
Após todo esse percurso, chegamos à quarta e última etapa: a de comprovação diagnóstica. Em posse dela, e conhecendo as características peculiares de cada paciente, pode-se decidir por uma proposta terapêutica e as possibilidades prognósticas e de evolução daquele paciente em específico.
A DEVIDA IMPORTÂNCIA DO RACIOCÍNIO CLÍNICO:
Após percorridas todas essas etapas, o bom raciocínio clínico permite a identificação da doença e o conhecimento do paciente, evidenciando-se o diagnóstico correto, com a proposta de melhor terapêutica possível, com a segurança exigida das evoluções e o prognóstico da doença.