Hoje, falaremos de um tipo especial de necrose, que ocorre em reações autoimunes: a necrose fibrinoide.
Ela ocorre principalmente em doenças autoimunes, como, por exemplo, a poliarterite nodosa. Também pode ocorrer na hipertensão arterial maligna e nas digestões enzimáticas teciduais, como em úlceras pépticas.
Vamos começar falando um pouco sobre o que é a poliarterite nodosa.
O que é a poliarterite nodosa?
A poliarterite nodosa é uma doença causada por complexos imunes, antígeno-anticorpo, que se formam na circulação sanguínea e depositam-se nos vasos sanguíneos. Ao depositarem-se nos vasos sanguíneos, ocorre ativação do sistema complemento e da resposta inflamatória aguda.
Em parte dos pacientes que possuem poliarterite nodosa, o antígeno da Hepatite B é encontrado no soro, ligado a anticorpos, formando assim os complexos imunes.
É uma vasculite sistêmica, que acomete principalmente artérias de médio e pequeno calibre, de diversos órgãos, sendo os mais acometidos: rins (os glomérulos não são acometidos), pele, articulações, músculos, nervos periféricos e trato gastrointestinal. A poliarterite nodosa pode acometer qualquer órgão, mas geralmente os pulmões não são acometidos.
Na poliarterite nodosa, os complexos imunes formados depositam-se nas paredes dos vasos, e isso ativa o sistema complemento pela porção Fc dos anticorpos. Uma vez ativado, a cascata do sistema complemento é iniciada, havendo produção de substâncias como C3a e C5a, que são anafilaxinas, e C3b e C5b, que são opsoninas. A ação dessas anafilaxinas é ativar a resposta inflamatória, principalmente pela quimiotaxia de neutrófilos e mastócitos. Com isso, os leucócitos, principalmente os polimorfonucleares, são atraídos ao local de deposição do complexo imune, e a reação inflamatória vai aumentando. Além disso, a porção Fc também é reconhecida por leucócitos e mastócitos, e, assim, esses são ativados por essa via também.
Uma vez ativadas, as células do sistema imune produzem substâncias vasoativas, interleucinas, quimiocinas. Isso promove maior chegada de células inflamatória, pois as substâncias vasoativas liberadas principalmente pelos mastócitos, como histamina, serotonina e bradicinina, promovem vasodilatação e aumento da permeabilidade vascular, aumentando o fluxo sanguíneo local e aumentando o espaço entre as células endoteliais.
Toda a resposta inflamatória, a tentativa dos neutrófilos em fagocitarem os complexos imunes, resultam numa secreção de substância pró-inflamatórias, como prostaglandinas, vasodilatadoras e quimiotaxinas promovendo aumento da resposta. Há secreção também de enzimas lisossomais, pois, uma vez que a fagocitose não é possível, os neutrófilos lançam mão de outros meios para tentar destruir os complexos. Mas o que acontece é que essas enzimas liberadas destroem a membrana basal e o tecido adjacente. No meio de toda essa resposta, há ainda a agregação plaquetária, que forma microtrombos, e estes contribuem para a isquemia local.
Havendo o processo isquêmico, o tecido sofre por hipóxia, e evolui para morte celular por necrose.
Há perda gradual dos núcleos celulares, devido ao processo de cariólise.
A necrose é do tipo fibrinoide, pois o aumento da permeabilidade vascular permite o extravasamento de substâncias, como a fibrina e também extravasamento de plasma para o interstício. Dessa forma, a fibrina se deposita na região necrótica.
A substância presente, conhecida como substância fibrinoide, possui, além da fibrina, restos celulares (das várias células que promoveram a resposta inflamatória), e imunocomplexos. Essa composta substância é característica da necrose fibrinoide.
E lembrando que é uma vasculite sistêmica, ou seja, o processo ocorre em diversos vasos de diversos locais/órgãos do organismo. O dano é grande e, caso não for tratada, pode ser letal.
Hipertensão arterial maligna
Um outro quadro que pode cursar com necrose fibrinoide é a hipertensão arterial maligna.
É uma síndrome composta por alterações como hipertensão arterial grave (a pressão diastólica se encontra acima de 130 mmHg), e lesões de órgãos alvo, como retinopatia com papiledema, com ou sem insuficiência renal, necrose fibrinoide de arteríolas renais e pode ser fatal.
Dentre essas alterações, vamos falar sobre os fenômenos vasculares que cursam com necrose fibrinoide. As lesões vasculares podem ocorrer em diversos órgãos como cérebro, baço, coração, pâncreas, intestino, e principalmente os rins. Acredita-se que a evolução da hipertensão arterial benigna para hipertensão arterial maligna, e os danos vasculares, ocorra por extremas elevações da pressão arterial. Esse déficit no equilíbrio dos mecanismos de autorregulação do fluxo sanguíneo, associado a uma vasoconstricção, fazem com que haja um aumento da pressão de perfusão.
A vasoconstricção provoca diminuição do fluxo sanguíneo, podendo causar isquemia e necrose das células musculares lisas presentes na parede arteriolar.
O aumento da pressão arterial, faz com que haja aumento da permeabilidade e extravasamento de componentes plasmáticos, como a fibrina.
Essa associação de necrose com fibrina extravasada e restos celulares, resulta na necrose fibrinoide arteriolar.
Qual a apresentação histopatológica da necrose fibrinoide?
A necrose fibrinoide, quando avaliada microscopicamente, é bem característica. Sua coloração é róseo-brilhante, quando corados por hematoxilina – eosina, pois o local necrótico com a substância fibrinoide é rico em proteínas como os imunocomplexos e a fibrina extravasada. Além disso, o “formato” dessa deposição pode ser comparado à chama de vela, sendo chamada de “lesão em chama de vela”. É um material hialino, homogêneo, eosinófilo (acidofílico).
Bons estudos pessoal! Até a próxima!
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