Com certeza você, como médico, ou como paciente, já atendeu alguém, já viu ou já ouviu falar de diversas fórmulas medicamentosas para o emagrecimento, para um envelhecimento saudável, para o “rejuvenescimento”, dentre outras indicações milagrosas para se alcançar o tão sonhado objetivo. Sendo assim, já começo o nosso artigo contando um grande segredo para vocês: a fórmula mágica não existe!
Pelo contrário, na maioria das vezes, algumas das fórmulas que estão sendo cada vez mais prescritas por alguns médicos ou profissionais da saúde (muitas vezes sem nem permissão para tal) com esse objetivo podem ser deletérias e culminarem em efeitos clínicos graves.
Alguns profissionais que realizam tais prescrições muitas vezes nem sabem o que estão prescrevendo e os possíveis efeitos colaterais. Fazem isso com a promessa de um milagroso efeito que atende o desejo tão ansioso do paciente.
Vivemos uma época em que queremos tudo para ontem, em que o esforço não é tão valorizado, que o caminho até a chegada não é vivenciado, e que o destino final quer ser alcançado às custas de qualquer preço (mesmo que esse preço seja a própria real saúde).
Isso faz com que o mercado por pílulas e receitas mágicas cresça exponencialmente e o desserviço à sociedade também.
Sou muito crítico ao uso de qualquer coisa que não possua embasamento científico consolidado, ainda mais nos casos em que além de não haver benefício comprovado, exista a chance de um possível risco à saúde.
Antes de continuarmos com a leitura, deve-se lembrar que o que traz benefício para um, pode não trazer para outro e, por isso, todo estudo e pesquisa científica com uso de medicamentos ou intervenções busca testá-los no maior número de indivíduos possíveis e com grande variedade entre si, para que os resultados possam ser extrapolados para a população geral.
Nos parágrafos e tópicos seguintes irei abordar um exemplo do que estamos lidando com um caso clínico acontecido na vida real (acrescentado de um pouquinho de “licença poética” e nomes fictícios), a fim de permitir nossa reflexão.
O CASO CLÍNICO DA FÓRMULA MÁGICA:
Vamos contar uma história aqui, baseada em fatos reais, mas como nome e alguns detalhes impulsionados pela imaginação do autor. Abaixo vou começar a contar um caso clínico de um paciente de “meia idade” que desejava emagrecer e envelhecer com saúde, segundo o mesmo.
Seu Antenor, 58 anos, grande empresário, morador de bairro nobre na cidade do Rio de Janeiro, praticante de atividade física 3x/semana (tênis, corrida na orla da praia), procura médico para ter a receita de alguma fórmula que o ajude a emagrecer e envelhecer da forma mais saudável possível.
É orientado, por alguns amigos e amigas, a procurar um “Doutor” que cuida de muitos artistas e prescreve coisas muito boas para a saúde. Sendo assim, Antenor agenda uma consulta, e acaba se espantando com a agenda lotada e com o preço cobrado pelo médico.
Depois de um tempo, é chegado o dia da consulta. O médico a quem ele procura lhe pede uma série de exames, tanto de sangue quanto exames de imagens e muitos outros, sem nem mesmo realizar um exame físico do paciente.
O profissional solicita dosagens de substâncias e vitaminas que nenhum outro médico havia solicitado a Seu Antenor (este pensa: “Esse médico é bom mesmo! Pedindo um montão de exames, alguns que eu nem sabia que existiam. Realmente vale pagar caro na consulta”).
Após realizar os exames solicitados e tê-los em mãos, Antenor marca o retorno para a avaliação dos exames e receber a tão sonhada “fórmula do rejuvenescimento”.
Na consulta, escuta elogios sobre sua condição de saúde, o médico relata que todos os exames estão normais, mas que uma vitamina ou outra, o zinco e mais algumas “coisinhas” estão um pouco abaixo do valor normal, mas que não precisava se preocupar, pois na fórmula teria tudo isso para ele ter uma vida mais saudável e maior disposição para suas tarefas diárias.
Antenor sai da consulta extremamente feliz e realizado com sua receita prescrita e vai na farmácia orientada pelo médico para mandar “manipular” a medicação.
São passados 3 meses, Antenor que vinha muito bem, animado com as cápsulas que usava diariamente, treinando ainda mais do que anteriormente, comendo de forma mais equilibrada, começa a sentir uma “fraqueza”, algumas parestesias (sensação de formigamento) nas mãos e nos pés, evoluindo progressivamente com piora.
Após alguns dias sentindo e isso e percebendo uma piora progressiva, dá entrada na emergência de um hospital famoso de sua cidade com quadro de astenia e paresia (perda de força) dos membros superiores.
Depois de intensa investigação, avaliação por uma equipe de vários especialistas (inclusive neurologistas pela queixa apresentada pelo paciente), acredita-se que o quadro apresentado se deve a uma hipocalemia grave (redução importante dos níveis séricos do potássio).
O potássio de Antenor se encontrava em 1,8 mmol/L (valor de referência: 3,5-5,5 mmol/L). Esse valor de potássio é extremamente perigoso, podendo apresentar arritmias cardíacas, em algumas vezes fatais.
Inclusive, Antenor já possuía um eletrocardiograma alterado com achatamento de onda T e depressão do segmento ST (outras alterações que podem ser encontradas: aparecimento de ondas U, prolongamento do intervalo QT).
Com esses achados, Antenor é internado para reposição do eletrólito e maior investigação. Após alguns dias internado, recebe alta assintomático e com potássio normalizado, com a orientação de não mais utilizar sua “fórmula do rejuvenescimento”.
O QUE A FÓRMULA MÁGICA DE ANTENOR POSSUÍA PARA NÃO SER MAIS UTILIZADA?
Passada todas as investigações para a causa dos sintomas do paciente, a hipocalemia foi a culpada pelo quadro clínico. Além disso, não existia nenhum outro fator causal dessa baixa de potássio, que não os componentes presentes na fórmula.
A “fórmula de rejuvenescimento” que Antenor vinha em uso continha: vitamina D3, vitamina K2 MK7, vitamina A, metilfolato, metilcobalamina, prasterona, testosterona base, cortisol base, “energy ATP”, dentre vários outros componentes.
O fato é que o uso de corticoide, diuréticos e vitaminas como ácido fólico e B12 em excesso podem levar à hipocalemia.
QUAL A CONCLUSÃO QUE DEVEMOS LEVAR DESSE CASO?
Primeiro de tudo, não existe fórmula mágica para um envelhecimento saudável, para a manutenção da saúde, para o emagrecimento, a não ser a prática de atividades físicas (preferencialmente bem orientada por profissional habilitado) e uma dieta balanceada.
Segundo ponto, é um perigo acreditar que qualquer intervenção não comprovada cientificamente que possa ter beneficiado alguém será capaz de beneficiar a todos. Pelo contrário, pode haver grandes riscos nessa conduta.
Terceiro ponto, vitaminas em excesso também podem causar danos à saúde. São as famosas hipervitaminoses, que também são transtornos.
A Medicina que praticamos hoje, na maior parte do mundo, é baseada em evidências. Portanto, toda e qualquer intervenção médica deve estar baseada, sim, na experiência de cada profissional, mas principalmente em dados obtidos por pesquisas bem controladas, realizadas com grupos controles, no maior número de pessoas possível.
Então, pessoal, tomemos cuidados ao prescrever para os nossos pacientes, e também ao decidirmos utilizarmos uma “vitaminazinha que não vai fazer mal”.
Obs: NÃO EXISTE FÓRMULA MÁGICA!
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