Dor torácica
Você acabou de se formar, te ofereceram aquele plantão de natal no hospital perto de sua casa, o dinheiro é bom, as condições de trabalho também, faltam 2 horas pra acabar o expediente. Sim, seu primeiro dia de trabalho foi perfeito… Só que não. Às 5h da manhã chega um senhor de 68 anos gritando de dor com a mão no peito (clássico sinal de Levine), hipertenso, dislipidêmico e diabético em tratamento irregular, somado a isso, num tempo de uma apneia entra no seu pronto socorro um homem de 35 anos com uma fáscies de desespero berrando que está infartando, palpitando e com medo de morrer. De repente, aquele ‘plantãozinho mole’ que te passaram se transformou num tremendo abacaxi. E aí, você está preparado para isso? Sabe fazer diagnóstico diferencial de dor torácica? Relaxa, a Jaleko vai preparar você! Vem com a gente!!!
Diagnósticos Diferenciais
Introdução
Na abordagem inicial da dor torácica, na unidade de emergência, devemos raciocinar de acordo com perfil do paciente, as características da dor e sintomas associados, sinais clínicos, até chegar na causa provável.
Nosso objetivo é fazer você, plantonista, pensar como se fosse o chefe da sala de emergência
A ideia aqui é que você memorize o PERFIL de cada paciente com dor torácica.
Ao final desse texto, você deverá saber reconhecer as principais etiologias. Não é nosso objetivo esgotar cada causa de dor torácica, mas sim fazer VOCÊ chegar ao diagnóstico do caso com a história e o exame físico.
Vamos começar ?! Vamos caso a caso…
CASO 1
Paciente 53 anos, sexo masculino, hipertenso mal controlado, é admitido em hospital geral com dor retroesternal em aperto, forte intensidade, com irradiação para o braço esquerdo. Ao exame, encontra-se taquipneico, pálido, sudoreico e acianótico.
PA 156×95 mmHg FC 99 bpm SpO2 96%
Ritmo regular, sem sopros. MVUA com crepitações basais bilaterais
Restante sem alterações.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: SÍNDROME CORONARIANA AGUDA
PONTOS-CHAVE: homem; fatores de risco: dor em aperto (típica) com irradiação para MSE; sudorese; exame clínico pouco expressivo (no caso, crepitações sugerindo congestão pulmonar); Acompanhado de sudorese, palidez.
CASO 2
Mulher, 45 anos, obesa mórbida, diabética e hipertensa, trazida ao PS após síncope no ambiente de trabalho. Nega dor torácica ou história de IAM prévio. Admitida consciente, orientada, taquipneica, acianótica. Extremidades frias. Pulsos finos. PA 85×46 mmHg FC 49 bpm FR 28 irpm
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: SÍNDROME CORONARIANA AGUDA
PONTOS-CHAVE: mulher com fatores de risco; ausência de dor, mas presença de equivalente anginoso (mais comum em mulheres obesas e diabéticas), bradicardia e hipotensão. Infarto de VD com extensão ao sistema de condução
CASO 3
Mulher, 39 anos, tabagista, em uso de anticoncepcional combinado, procura serviço de emergência devido a dor torácica iniciada há cerca de 12h, que piora com a respiração.
Ao exame: Consciente, orientada, taquipneica, acianótica.
FR 32 irpm FC 110 bpm SpO2 96% PA 139×82 mmHg
Durante espera de realização de exames complementares evolui com hemoptise…
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: TEP
PONTOS-CHAVE: mulher com fatores de risco (anticoncepcional + tabagismo); dor pleurítica aguda; dispneia e taquicardia; hemoptise.
Só faltou dizer que estava com sinais de TVP. Mas aí ficaria muito fácil mesmo. Outro exemplo, é o do paciente no pós-operatório imediato ou paciente portador de neoplasia.
CASO 4
Homem, 24 anos, sem comorbidades, queixa-se de dor torácica que piora com a inspiração profunda e dispneia progressiva há 5 dias. Ao exame encontra-se taquicárdico e dispneico.
Ausculta pulmonar com crepitações até 1/3 médio bilateralmente. Ritmo regular em 3T (B3). Precórdio hipercinético. Ruído sisto-diastólico contínuo e grave, pancardíaco.
Abdome e MMII edemaciados. Extremidades quentes.
História pregressa: NDN, exceto por infecção de garganta há 1 mês.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: PERICARDITE AGUDA
PONTOS-CHAVE: homem jovem; história de IVAS recente (infecção pelo vírus Coxsakie); dor pleurítica, sinais de congestão pulmonar e sistêmica (insuficiência cardíaca), ausculta de som compatível com atrito pericárdico, melhora da dor em posição sentada com o corpo inclinado a frente
CASO 5
Homem, 63 anos, hipertenso e tabagista, chega à emergência com dor retroesternal lancinante iniciada há 1 hora enquanto carregava caixas pesadas no trabalho. Refere irradiação para o dorso.
Ao exame: PA 175×105 mmHg FC 102 bpm SpO2 94% FR 38 irpm.
Pulsos radiais discrepantes (direito > esquerdo).
Ritmo regular, sopro diastólico 4+/6+ no foco aórtico e aórtico acessório.
MV com crepitações difusas bilaterais.
Abdome e MMII sem alterações significativas.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: DISSECÇÃO AÓRTICA
PONTOS-CHAVE: homem idoso; tabagista e hipertenso, dor súbita intensa (lancinante) com irradiação para o dorso após esforço significativo, assimetria de pulsos periféricos, sopro de regurgitação aórtica + sinais de insuficiência cardíaca aguda, concomitância de hipertensão (emergência hipertensiva)
CASO 6
Mulher 43 anos, procura PS clínico, em virtude de dor torácica retroesternal, intermitente associada à disfagia ocasional há 3 meses mas, que hoje está mais intensa. Nega quaisquer comorbidades. Nega perda ponderal significativa.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: ESPASMO ESOFAGEANO DIFUSO
PONTOS-CHAVE: Mulher sem comorbidades, presença de disfagia associada à dor retroesternal, episódios agudos de problema crônico, ausência de fatores de risco cardiovasculares.
CASO 7
Mulher, 29 anos, sem comorbidades, exceto por transtorno de ansiedade generalizada, procura PS em razão de dor torácica difusa e intensa, há 24h antes. Refere piora da dor ao tossir e respirar. Dor precipitada à palpação dos arcos costais. Refere melhora parcial com analgésicos. Sem demais alterações ao exame físico.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: COSTOCONDRITE AGUDA
PONTOS-CHAVE: Mulher jovem, associação com doença psiquiátrica, dor precipitada pela palpação das cartilagens costocondrais, ausência de fatores de risco cardiovasculares.
CASO 8
Homem, 31 anos, tabagista, procura emergência ao apresentar há 3 horas dor torácica à direita de forte intensidade. Ventilatório-dependente associado a dificuldade para respirar. Nega tosse, hemoptise ou dor precordial. Sem comorbidades.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: PNEUMOTÓRAX PRIMÁRIO ESPONTÂNEO
PONTOS-CHAVE: Homem jovem, tabagista, longilíneo, ausência de comorbidades (por isso primário) ou trauma (por isso espontâneo), dor tipo pleurítica + dispneia súbita.
CASO 9
Mulher, consulta no ambulatório por dor retroesternal em queimação há 6 meses, que piora com jejum e à noite. Refere alívio com antiácidos. Nega perda ponderal ou disfagia. Nega fatores de risco cardiovasculares. Há um mês iniciou tosse seca.
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO: DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO
PONTOS-CHAVE: Dor em queimação, melhora com antiácidos, sem fatores de risco cardiovasculares, presença de sintomas atípicos como a tosse seca, piora com a posição supina pós-prandial.
É isso pessoal! Uma breve noção dos possíveis diagnósticos diferenciais. Amanhã voltamos com a avaliação de síndrome coronariana aguda na sala de emergência. Fique ligado!
Veja mais sobre a arritmia mais frequente na prática clínica com prevalência entre 0,5 e 1% no artigo DIRETO AO PONTO: Fibrilação Atrial