Introdução:
A psiquiatria é o ramo da medicina que estuda os transtornos mentais pensando em sua prevenção, diagnóstico e tratamento (medicamentoso e psicoterápico). Assim como as outras áreas da medicina, a psiquiatria não poderia ser diferente e deixar os epônimos (termos gerados a partir de nomes de pessoas) de lado.
No entanto, como existem vários epônimos na medicina, necessitamos de auxílio para fixarmos esse conteúdo na memória e podermos evocá-los/recuperá-los mais facilmente quando necessário. Pensando nisso, vamos abordar, além de suas definições e características, algumas regras mnemônicas para facilitar, agilizar e “eternizar” os conceitos dos principais epônimos psiquiátricos. Estudaremos sobre as síndromes de:
Muitos nomes, não é? Mas não se preocupe, vamos tornar as coisas bem simples daqui pra frente. Será uma aprendizagem prazerosa e você ficará surpreso com o quão fácil será para lembrar de todos esses epônimos apresentados acima.
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Síndrome de Capgras
# Regra Mnemônica:
É só associar a letra “S” do final da palavra Capgras à “SÓSIA”.
# Origem do Epônimo:
O Delírio de Sósias (Síndrome do Impostor ou Ilusão de Sósias), outra forma de denominação da Síndrome de Capgras, foi descrita a primeira vez em 1923 por Joseph Capgras e Jean Reboul-Lachaux.
# Definição/Características:
É a síndrome onde o paciente apresenta um delírio de identificação (um tipo de desorientação alopsíquica), quando ao olhar para uma pessoa familiar o vê com um sósia, sendo ele fisicamente idêntico, mas psicologicamente distinto. É um falso desconhecimento delirante.
Elie Cheniaux, em seu manual de psicopatologia, relatou um caso de uma paciente internada em um hospital psiquiátrico que diariamente recebia visitas de sua mãe. Todavia, ela tinha plena convicção de que eram irmãs gêmeas de sua mãe que a visitavam, fazendo-se passar por ela.
# Transtornos clínicopsiquiátricos relacionados:
Observado principalmente nos transtornos do humor e na esquizofrenia, assim como em doenças cerebrais e transtornos delirantes com sintomas psicóticos.
Síndrome de Fregoli
# Regra Mnemônica:
A letra “F” é de “falso” e a sílaba “Re” é pra lembrar de “Reconhecimento. Juntando tudo: “falso reconhecimento” delirante.
# Origem do Epônimo:
Courbon e Fail, em 1927 descreveram essa síndrome ao reconhecer suas características no ator italiano Leopoldo Fregoli, que era famoso por sua habilidade de fazer, durante suas atuações, varias mudanças em sua aparência.
# Definição/Características:
Fregoli é o falso reconhecimento delirante, onde o indivíduo olha pra uma pessoa desconhecida e o reconhece erroneamente como um familiar, vendo ele fisicamente diferente, mas psicologicamente idêntico.
Elie Cheniaux também relatou um caso em que o paciente abraçava um colega de quarto convencido de que ele era seu pai, embora reconhecesse que o seu pai estava com o rosto completamente diferente.
# Transtornos clínicopsiquiátricos relacionados:
Assim como a síndrome de Capgras, pode ser observado nos transtornos do humor, na esquizofrenia, e nas doenças cerebrais e transtornos delirantes com sintomas psicóticos.
Sindrome de Clérambault
# Regra Mnemônica:
O “Er” é o inicio da palavra erotomania (outro termo que designa essa síndrome). A letra “B” faz menção a William Bonner, jornalista da Rede Globo de TV, sendo um potencial “alvo” de pessoas que manifestem esse tipo de delírio.
# Origem do Epônimo:
É uma síndrome também conhecida como erotomania, termo proposto por Kraepelin como uma forma de paranoia. Todavia, ela foi eternizada como síndrome de Clérambault após a publicação, em 1921, da obra Les Delires Passionels por Gaëtan Gatian de Clérambault.
# Definição/Características:
Clérambault descreveu uma condição mental delirante na qual a pessoa afetada, em geral do sexo feminino (mas lembrando de que também pode acometer homens), tem convicção irrefutável de que é amada por alguém, na maioria das vezes, mais velho e/ou que possui uma situação socioeconômica mais elevada que a do paciente (uma pessoa famosa, na maioria das vezes), crendo ser amada a distancia.
A pessoa afetada tende a insistir que, na verdade, o “objeto” do amor é quem faz as primeiras manifestações amorosas, podendo ser interpretadas todas as gesticulações, olhares, comunicações verbais e não verbais como evidencias do amor correspondido, chegando a referir que até mesmo por meio de telepatia há comunicação entre eles. Além disso, o indivíduo pode pensar que a malevolência de terceiros leva a não aproximação por parte da outra pessoa.
# Transtornos clínicopsiquiátricos relacionados:
Geralmente ocorre no transtorno delirante e no alcoolismo crônico.
Sindrome de Cotard
# Regra Mnemônica:
O “Tard” é para nos lembrar de “tarde demais”, referindo-se ao fato de a pessoa pensar que já esta morta, ou seja, que já não da mais tempo de “salvá-la”.
# Origem do Epônimo:
Tal condição foi descrita pioneiramente em 1880 por Jules Cotard, psiquiatra e neurologista francês, que relatou um caso de uma paciente de 43 anos de idade que estava com convicção plena de não ter mais alma, estômago ou cérebro.
# Definição/Características:
A síndrome de Cotard é uma condição psiquiátrica na qual a pessoa acometida acredita estar morta ou condenada à imortalidade, estando fadada ao sofrimento eterno, alimentando delírios niilistas (no sentido de destruição completa ou não existência) e de negação, podendo crer que seus órgãos apodreceram, pararam de funcionar ou não existem mais ou que o coração não mais está batendo. Ele pode acreditar que não está vivo, que não existe mais ou que nunca existiu.
# Transtornos clínicopsiquiátricos relacionados:
Pode ocorre na depressão ou na esquizofrenia.
Síndrome de Ganser
# Regra Mnemônica:
A sílaba “Gan” é para lembrar de “Gângster”, um criminoso/mafioso ou ladrão. Assim nos lembramos de que foi inicialmente descrito em prisioneiros.
#Origem do Epônimo:
Em 1897, Sigbert Ganser observou e descreveu uma patologia observada em três prisioneiros, dando seu nome à síndrome.
# Definição/Características:
Ganser relatou as seguintes características: embotamento afetivo, mudanças histéricas de humor, alucinações, início e remissão muito rápida e completa, com amnesia e perplexidade posterior. Além disso, tinham respostas aproximadas (denominadas por muitos autores como “pararrespostas”) para perguntas as mais elementares possíveis.
Por exemplo: “Quantas patas tem um cachorro?” – Resposta: “Cinco”; ou então: “Quantos são ‘3 × 3’ ?” – Resposta: “Dez”. => conforme descrito (ipsis litteris) por Cheniaux em seu manual de psicopatologia. Ou seja, mesmo entendendo a pergunta e sabendo a resposta, deliberadamente responde de maneira incorreta, mas com conteúdo relacionado à pergunta.
Outras denominações descritas: “psicosis de los prisioneros” (psicose dos prisioneiros), “síndrome del sinsentido” (síndrome do sem sentido), “simulación patológica” (simulação patológica), “pseudoestupidez histérica”, entre outros.
# Transtornos clínicopsiquiátricos relacionados:
Com o exposto, pensamos logo em uma causa histérica ou de simulação/transtorno factício para tal síndrome, todavia causas orgânicas e psicóticas também podem estar associadas ao quadro descrito.
Síndrome de Ekb
# Regra Mnemônica:
Esse é o mais fácil de lembrar, é só pronunciar o “K” normalmente (“CÁ”) que chegamos à palavra “ECA”, expressão que se relaciona a nojo ou aversão a alguma coisa. Isso para lembrar a aversão que muitos têm a vermes ou baratas, por exemplo.
# Origem do Epônimo:
Acarofobia foi o termo inicialmente descrito por Thiberge em 1894; todavia, a síndrome foi definida mais de 40 anos depois (1938) por Ekbom, que deu seu nome à síndrome.
# Definição/Características:
A síndrome de Ekbom é uma forma especial de delírio somático – delírio de infestação, também conhecida como delírio de parasitose ou parasitose psicogênica. O paciente tem a firma convicção de estar infestado por vermes, que saem e caminham pela pele, principalmente do couro cabeludo, boca olhos ou região genital.
Os sintomas podem se iniciar abruptamente ou de maneira mais lenta, sendo prurido, “pinicamento”, formigamento, parestesias (como manifestações táteis) e sensação de parasitismo os sintomas mais frequentes.
Neste sentido, o próprio paciente, no intuito de “retirar” os parasitas da pele, acaba ocasionando de escoriações discretas a úlceras francas e cicatrizes, que têm geralmente localização simétrica.
Um sinal intrigante que pode estar associado ao quadro clinico acima é o “sinal da caixa de fósforo”, no qual o paciente coleciona insetos, papel ou até mesmo pedaços de pele, identificando-os como parasitas. Podem mesmo descrever, nos mínimos detalhes, a morfologia, o ciclo vital e os hábitos desses “parasitas”, bem como todos os pormenores de como ele consegue elimina-los temporariamente.
# Transtornos clínicopsiquiátricos relacionados:
Fobias, hipocondria, ansiedade, esquizofrenia e transtornos delirantes orgânicos e não orgânicos complicados por depressão ou psicose.
Resumo:
Conclusão:
O processo mnêmico se dá em três etapas: fixação ou registro, conservação ou retenção e evocação ou recuperação. A segunda etapa (retenção) é o processo mais difícil na hora que estamos estudando, pois é nessa etapa que os conteúdos estudados são registrados como uma memória de curto ou de longo prazo.
Como a pretensão ao estudar é fixar o assunto de tal modo que possa utilizá-lo em longo prazo quando necessário, devemos potencializar esse processo de duas formas principais: através de repetição e de associação com outros elementos (como nomes de pessoas, objetos, lugares, entre outros).
Assim, aproveite as sugestões acima, repita cada conceito e associação (além de criar outras) o maior número de vezes possível para que a etapa de recuperação do processo mnêmico se dê da melhor forma possível.
Referências:
Alves, Cinthia Janine Meira ET AL. Síndrome de Ekbom secundária a transtorno orgânico: relato de três casos. An Bras Dermatol. 2010;85(4):541-4.
Cheniaux, Elie. Manual de Psicopatologia. 5º ed., 2015.
Dalgalarrondo, Paulo. Psicopatologia e Semiologia dos Transtornos Mentais. 3ª Edição, 2018.
Gómez, Belén Jiménez; Quintero, Javier. El síndrome de Ganser: revisión a propósito de un caso. Servicio de Psiquiatría Hospital Infanta Leonor Madrid. Actas Esp Psiquiatr 012;40(3):161-4.
Mendoza, Laura ; Munguía, Juan C. Síndrome de Capgras.
Sampaio et al. Síndrome de Clérambault: desafio diagnóstico e terapêutico –. Rev Psiquiatr RS. 2007;29(2) – 213.
Santos, Mário de Castro Marques dos; Abordagem e Etiologia do Síndrome de Capgras: Uma Revisão Sistemática. Teste de mestrado. Instituto de Ciências Biomédicas de Abel Salazar Universidade do Porto. 2013.
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