Introdução:
Durante a faculdade de Medicina, nos deparamos com o estudo dos diversos órgãos e estruturas que compõem o nosso corpo, estudo este também chamado de anatomia humana. Dentro da disciplina de anatomia, estudamos, com detalhes, cada um de nossos órgãos e como eles se organizam dentro do corpo humano. Nas aulas de neuroanatomia, estudamos o encéfalo, assim como os sulcos, giros e lobos que o compõe. No encéfalo, encontramos uma estrutura extremamente importante na organização das informações que são chegadas ao cérebro, que é também chamada de corpo caloso. Sem ele, nós não conseguimos conectar adequadamente as informações provenientes de cada um dos hemisférios cerebrais. Neste artigo, você irá conhecer uma das principais patologias que acomete o corpo caloso e saber também quais as sequelas que ela pode deixar no organismo dos indivíduos que a possuem.
O corpo caloso:
O corpo caloso é uma estrutura formada pela união de diversas fibras mielínicas, que vão se cruzar no plano sagital do cérebro e penetrar no centro branco medular do mesmo, fazendo, então, a união dos dois hemisférios cerebrais. Estima-se que o corpo caloso seja formado por cerca de 200 a 250 milhões de projeções axônicas.
Nós podemos dividir o corpo caloso em tronco, joelho, esplênio e rostrodo corpo caloso. O tronco do corpo caloso, também conhecido como corpo, corresponde a face superior da estrutura. Nele, nós conseguimos observar um sulco longitudinal. O joelho do corpo caloso nada mais é do que a extremidade anterior do mesmo. Ele constitui a sua região mais afinada. O esplênio do corpo caloso é uma dilatação posterior do tronco do corpo caloso. Essa estrutura vai sofrer uma flexão em sua parte mais anterior (indo em direção à base cerebral) e vai formar o joelho do corpo caloso. O fórnix é uma outra estrutura importante que está associada ao corpo caloso. Ele é um conjunto de fibras, organizadas na forma de feixe e composto por duas metades: uma lateral e uma medial. Esses feixes são dispostos de maneira simétrica e as metades se unem entre si, por meio de um septo denominado de septo pelúcido.
Embriologia e anatomia:
O corpo caloso, em relação a sua embriologia, é formado no sentido antero-posterior, com exceção do rostro do corpo caloso, que é a última estrutura a ser formada. Essa estrutura atinge o seu nível máximo de maturação por volta da décima sétima semana de gestação. Nesse período, ele começa a sofrer um espessamento de seu córtex cerebral, associado a maturação dessa estrutura, também no sentido antero-posterior.
Entre a décima e a décima segunda semana de gestação, ocorre a formação da placa comissural. Essa placa é formada na comissura dorsal do corpo caloso, em sua lâmina terminal, e possui como função primordial induzir a formação do leito, para que a decussação das fibras comissurais calosas possam ocorrer. Se essa placa comissural não é formada, a decussação das fibras comissurais não ocorre, causando uma agenesia, que chamamos de agenesia total primária do corpo caloso. Já se o processo for interrompido em algum ponto, irá acarretar em uma agenesia parcial do corpo caloso.
Agenesia de corpo caloso:
Na agenesia de corpo caloso (ACC), os indivíduos, devido uma alteração congênita, não apresentam o corpo caloso.
Por outro lado, manifestam um aumento significativo dos cornos occipitais (colpocefalia). Ela pode ser total (quando nenhuma das partes do corpo caloso é formada), parcial (quando apenas uma parte dele é formada), encurtamento (ele existe, porém em formato reduzido) e/ou desenvolvimento incompleto. A sua ausência pode ou não apresentar sintomas na vida do paciente. Normalmente, os indivíduos não manifestam qualquer sintoma, sendo assintomáticos durante toda a sua vida. Nos pacientes que, por ventura, apresentem algum tipo de sinal ou sintoma, eles podem variar desde uma epilepsia, até um atraso no seu desenvolvimento psicomotor.
Sua incidência ainda é bastante desconhecida pelos principais autores, porém a maioria dos casos ocorre esporadicamente, e não há predominância entre os sexos masculino e feminino.
Tipos:
A agenesia de corpo caloso pode ser classificada em 3 tipos principais. A tipo I é quando ocorre uma agenesia total do corpo caloso. A do tipo II ocorre uma agenesia parcial do corpo caloso, logo, neste tipo, o esplênio e o rostro do corpo caloso estarão sempre ausentes. Enquanto na tipo III ocorre uma redução do tamanho desse corpo caloso, por isso também é chamada de hipoplasia. A tipo III também está muito associada a outras síndromes, assim como a alterações no córtex cerebral dos pacientes acometidos.
Sintomas:
Dentre os sintomas principais já discutidos no parágrafo anterior deste artigo, os pacientes também podem apresentar algumas síndromes decorrentes da ausência do corpo caloso. Dentre elas, podemos destacar a síndrome de desconexão cerebral. Nessa síndrome, as informações que chegam aos nossos hemisférios cerebrais, não são compartilhadas entre os hemisférios. Como assim? Qualquer informação que chegar ao hemisfério direito, por exemplo, não irá ser transmitida para o hemisfério direito, e vice-versa. Os pacientes, além dessa dissociação completa entre os hemisférios cerebrais, podem ainda apresentar cefaleias, hemiparesia e hipotonia. Além disso, os pacientes também podem manifestar sintomas como convulsões, retardo no desenvolvimento psicomotor (como já abordado anteriormente), retardo mental variável (o que irá depender da extensão em que a agenesia se encontra, assim como da associação com outras lesões, quadro bastante comum nos pacientes que possuem agenesia de corpo caloso). 20% dos pacientes pode ainda apresentar macrocrania, relacionada frequentemente a alguns cistos inter-hemisféricos.
A agenesia de corpo caloso pode estar, frequentemente, associada a algumas síndromes, dentre elas: síndrome de Aicardi, malformações do tipo Chiari, entre outros. A síndrome de Aicardi é uma anomalia congênita, extremamente rara, que se caracteriza pela ausência (total ou parcial) do corpo caloso, anomalias na retina e convulsões. A hidrocefalia também pode estar bastante associada nesses casos.
Diagnóstico:
A agenesia de corpo caloso pode ser suspeitada ainda durante a vida intrauterina, através de um simples exame de ultrassonografia. Quando a criança nasce, a ultrassonografia é substituída pela ressonância magnética ou uma tomografia computadorizada. Cabe lembrar que não existe uma idade especifica para que o diagnóstico seja realizado, visto que a agenesia de corpo caloso pode se mostrar assintomática durante toda a vida do paciente, como já discutido anteriormente, sendo descoberta, portanto, em exames de rotina que o individuo possa vir a realizar por outros motivos.
Nos exames de imagem, nós podemos encontrar alguns achados típicos da agenesia de corpo caloso. Na agenesia total ou parcial, nós podemos encontrar, avaliando a tomografia computadorizada, ventrículos laterais separados e que não se convergem. Isso estará associado a um aumento dos cornos occipitais, o que chamamos de colpocefalia, associada a 40% dos casos de agenesia de corpo caloso. Podemos ainda perceber as bandas de Probst, que nada mais são do que aquelas fibras calosas, comentadas anteriormente, que não foram decussadas.
Conclusão:
A agenesia de corpo caloso é uma importante anomalia congênita que, por ser assintomática na maioria das vezes, dificulta o diagnóstico da patologia. Porém, com o avanço dos métodos de imagem (tomografia computadorizada e ressonância magnética), o diagnóstico precoce da patologia se tornou mais eficaz, assim como a associação com as diversas síndromes cerebrais. Por isso, sempre que suspeitarem de alterações no desenvolvimento e na cognição de um paciente, um exame de imagem se torna fundamental para elucidação diagnóstica e quanto a etiologia do quadro.