Introdução
Fala pessoal, tudo bem? Hoje nós vamos começar mais uma pequena série de posts, pra te ajudar a manejar um tipo de paciente que vai ser muito frequente na sua prática médica: um paciente homem sem queixas aparentes. Afinal de contas, quem nunca viu aquele paciente que, quando perguntado sobre o que estava sentindo, principalmente em consultas ambulatoriais, ou numa realidade de atenção primária, respondeu que não sentia nada.
Paciente homem sem queixa
Principalmente homens, costumam ter esse tipo de relação com o sistema de saúde – em geral têm menor atenção com a própria saúde, sobretudo no nível da atenção primária, o que deve nos levar a ter cuidado redobrado no seu manejo dentro desse contexto.
[show_more more=”Ler mais” less=”ler menos” color=”#008ec2″ size=”120″ align=”center”]
Dessa forma, pra que você saiba na ponta da caneta como deve abordar esse tipo de caso, vamos discutir nesse e nos próximos posts as orientações da American Academy of Family Physicians (AAFP), publicadas em dezembro de 2018 na American Family Physician, dividindo a abordagem dos homens em três pontos-chave: riscos inerentes ao estilo de vida e saúde mental; screening de condições crônicas; e por fim, screening para neoplasias.
Antes de tudo: quais os nossos objetivos com isso?
Bom, nossa intenção ao manejar um paciente como o que descrevemos nada mais deve ser do que promoção de saúde e bem-estar a esse indivíduo, além de rastrear e reduzir morbimortalidade por condições crônicas e oferecer rastreamento adequado para neoplasias.
O fundamental ao focar nos alvos que citamos é saber praticar tudo o que foi dito baseado em evidências científicas de qualidade, evitando assim que o nosso paciente seja submetido a procedimentos desnecessários, os quais não tenham reconhecido benefício em termo de sobrevida ou qualidade de vida.
Exatamente por isso, vamos debater esse assunto hoje, com o propósito de esclarecer o que tem sustentação em base científica, e o que não devemos buscar, por não representar ganho de nenhuma natureza ao nosso paciente que, lembramos, está bem e sem nenhuma queixa.
História, estilo de vida e saúde mental
Na avaliação médica dos homens, a história deve contemplar a história médica pregressa do paciente questionando doenças e cirurgias prévias, uso presente de medicamentos e alergias. Além disso, a história familiar relevante de doenças crônicas e neoplasias também deve ser abordada.
Outro componente fundamental na anamnese desses pacientes deve ser a história social, com foco em comportamentos de risco para morbimortalidade prematura, como abuso de substâncias, risco de exposição ao HIV e outras infecções sexualmente transmissíveis, dieta habitual e prática de exercícios físicos. Dentro desses elementos, vamos apresentar as recomendações da AAFP para cada questão relacionada a esses fatores.
Tabaco, álcool e uso de drogas ilícitas
Segundo as orientações da AAFP, homens devem ser questionados sobre o consumo de tabaco em cada consulta; e para aqueles que fumam, deve-se oferecer intervenções comportamentais, bem como eventualmente uso de farmacoterapia (por exemplo, da bupropiona) como adjuvante na interrupção do tabagismo.
Em relação ao consumo de álcool, é nosso papel buscar em nosso paciente evidências de consumo exagerado do mesmo, podendo utilizar ferramentas como o questionário CAGE, por exemplo, a fim de identificar apropriadamente indivíduos ditos de risco em relação ao consumo de álcool. Para estes, devemos oferecer intervenções de aconselhamento comportamental.
No que se refere ao uso de drogas ilícitas, algumas instituições como a USPSTF seguem estudos não mostraram benefício em se rastrear de rotina essa questão nas consultas; já outros órgãos como o National Institute on Drug Abuse sugerem que seja buscado durante o atendimento se há consumo de drogas sem prescrição médica, ou uso de drogas ilícitas, para fins de intervenção.
Infecções sexualmente transmissíveis
A AAFP recomenda o rastreamento de infecção pelo HIV em todos os homens entre 18 e 65 anos, pelo menos uma vez, independente de fatores de risco adicionais.
Além disso, o artigo cita que homens considerado de alto risco, como aqueles com múltiplos parceiros sexuais, homens que têm relações sexuais sem preservativo, e homens que se relacionam com outros homens, devem ser rastreados para infecções sexualmente transmissíveis, incluindo sífilis. A USPSTF recomenda oferecer aconselhamento comportamental de alta intensidade em alguns desses casos, quando apropriado.
Depressão, Obesidade e Hábitos Relacionados
Com relação à depressão, devemos rastrear sempre todos os homens durante a consulta, uma vez que existam os sistemas de suporte e cuidado em saúde mental disponíveis, na intenção de alcançar diagnósticos acurados, proporcionar tratamento efetivo e seguimento adequado para estes casos.
A questão da obesidade também deve ser abordada em todas as consultas, utilizando como ferramenta o cálculo do índice de massa corpórea (IMC); para aqueles que apresentarem valores iguais ou maiores que 30kg/m2, devemos novamente lançar mão de intervenções multicomportamentais intensivas, objetivando encorajar a perda gradual e sustentada de peso até níveis considerados ideias para cada indivíduo.
Por fim, em se tratando de hábitos dietéticos e atividade física, a AAFP recomenda oferecer aconselhamento comportamental a todos os homens que se apresentem com sobrepeso ou obesos, e com fatores de risco cardiovascular adicionais, com a finalidade de promover hábitos de dieta saudável e prática rotineira de atividade física; a orientação alimentar deve indicar redução no consumo de gorduras saturadas, colesterol, sódio e carboidratos, além de prática de ao menos 150 minutos de atividade física aeróbica moderada, somada a fortalecimento muscular ao menos 2 vezes por semana.
Com isso, podemos perceber a vasta quantidade de questões que precisamos estar atentos no nosso paciente, apenas no campo do estilo de vida e saúde mental, mesmo que ele chegue sem absolutamente nenhuma queixa para o nosso atendimento. Porém ainda tem muito mais a ser abordado nesses casos, e nós vamos continuar discutindo como manejar esses pacientes. Um abraço e até a próxima!
Veja também: “Faculdade de Medicina na UERJ: saiba tudo sobre o curso”.
[/show_more]