Bom, o Thomas eu não sei, mas se você é um estudante de medicina e já passou do primeiro período da faculdade com certeza já deve ter ouvido falar do Polígono que recebe o nome de Thomas Willis, o famoso Polígono de Willis. Durante as aulas da temida neuroanatomia, você estudou a formação, função e principais patologias associadas à ele. E também sentiu muito cheiro de formol nas longas tardes e noites em que passou no anatômico estudando, com as peças em cima da bancada e o roteiro de aula ao lado delas, para compreender esse sistema complexo formado na base do cérebro que foi evidenciado por Thomas Willis.
Thomas Willis
Thomas Willis nasceu no dia 27 de janeiro de 1621 na cidade de Bedwyn, na Inglaterra. Filho de fazendeiros e o caçula da família, estudou o colegial na Escola Edward Silvester. Antes de se tornar médico, se formou na faculdade de Artes em 1639, concluindo também o mestrado na área artística. Adentrou na faculdade de medicina na Universidade de Oxford, na Inglaterra, após a guerra civil que ocorreu naquela região, concluindo o curso de medicina e recebendo seu diploma de bacharel no ano de 1646. Logo após a formatura, começou trabalhando como conselheiro em medicina, tendo visitado diversas aldeias próximas à Oxford. Passava tanto tempo naquela universidade que foi lá onde encontrou seu grande amor, se unindo em matrimônio com a filha do vice-chanceler de Oxford, Mary Fell. Engravidou Mary 9 vezes, porém apenas quatro de seus filhos tiveram a oportunidade de viver uma longa vida ao lado de seus pais. Posteriormente, em 1660, iniciou sua carreira no magistério como professor de Filosofia da universidade de Oxford, a mesma em que se formou, durante 15 anos.
Um fato importante que marcou a carreira de Thomas Willis como médico aconteceu no ano de 1650, ano em que Anne Green era condenada por infanticídio e condenada ao enforcamento. Seu corpo foi doado ao centro de estudos de Oxford, fato este que deixou Willis bastante animado, pois com a chegada de uma nova peça ele poderia aprimorar seus estudos sobre o sistema nervoso. Porém, quando o corpo de Anne chegou ao anatômico de Oxford e Willis foi retirá-lo do caixão em que chegou para colocar em conserva, percebeu que Anne realizou um breve suspirou. Com isso, ele e um amigo que o acompanhava iniciaram as técnicas de ressuscitação, visando reanima-la, e obtiveram sucesso.
Em 1667, o médico que descreveu o polígono de Willis se mudou para Londres, local onde construiu sua própria clínica. Após o falecimento de sua esposa Mary, casou-se com Elizabeth Calley, que também era viúva.
Durante seus anos de estudo, Thomas dedicou grande parte da sua carreira no aprofundamento de suas pesquisas na área da anatomia e fisiologia, principalmente do sistema nervoso. É sabido que os componentes desse sistema já eram bastante conhecidos, porém nenhum pesquisador havia juntado as funções de cada aparelho que fazia parte do sistema nervoso como se fosse um único conjunto, capaz de desempenhar a mesma função. Sendo assim, ele trabalhava no anatômico de sua faculdade realizando diversos experimentos em animais (como peixes, anfíbios e répteis) até que chegou ao resultado que tanto procurava. Resultado este que, naquela época, Thomas nunca imaginava que iria tomar essas proporções.
Mas o que continha nesse estudo?
Dissecando o tecido nervoso das cobaias, Willis conseguiu demonstrar com exatidão o trajeto desses nervos que entram e saem da caixa craniana, se ligando assim ao encéfalo. E não parou por aí! Evidenciou também as reações automáticas que eram realizadas por esses nervos, além de diagnosticar o papel dos vasos da base craniana que tinham o formato de um polígono, tanto que receberam o nome de Thomas Willis como recompensa pelos seus estudos. Todavia, seus estudos foram além das pesquisas e experimentos em anatomia e fisiologia humana, momento em que o descobridor do Polígono de Willis se tornou um dos médicos a descreverem a semiologia da enxaqueca, miastenia e epilepsia.
Contribuições para a medicina
Thomas Willis além de médico, anatomista e fisiologista, se destacou durante toda a sua vida em sua carreira de autor. Escreveu diversos livros, dentre eles o seu livro que ficou mais famoso naquela época, denominado “Cerebri Anatome”, ou seja, a anatomia do cérebro. Nesse livro ele pregava suas ideias de acordo com o que havia presenciado e constatado nos longos anos que passou estudando. Uma dessas ideias era de que o cérebro, assim como seus componentes, era o órgão mais importante de todo o corpo humano. Outra publicação importantíssima foi em 1667, quando publicou o livro “Pathologicae cerebri, et nervosi generis specimen”, livro este que continha um extenso estudo que Willis havia realizado e que envolvia fatores da patologia, assim como da neurofisiologia do cérebro dos seres humanos. Foi nesta mesma obra que ele relatou a descoberta acerca da etiologia das crises convulsivas e outros distúrbios convulsivos, teorias estas que ajudaram a psiquiatria mundial no diagnóstico precoce dessas doenças.
Foi o primeiro profissional a dar nomes aos nervos cranianos! Essa nomenclatura mesmo que utilizamos até hoje (I, II, III, e assim por diante). E também o primeiro a diagnosticar a miastenia gravis no ano de 1671, patologia esta que se apresenta como uma fadiga muscular de característica crônica em que o paciente evolui com paralisia progressiva. Outro achado que, embora não seja relacionado com a neurologia faz parte do estudo da clínica médica em geral, foi que Thomas passou a utilizar a urina doce como critério diagnostico para diabetes mellitus, critério este que havia caído por terra há tempos.
Polígono de Willis
Thomas, como já mencionado anteriormente em suas contribuições para a medicina, descreveu com detalhes a vascularização arterial do encéfalo. Relembrando as suas aulas de neuroanatomia, você aprendeu que o encéfalo é vascularizado por dois grupos principais: as vértebro-basilares (ou artérias vertebrais) e carotídeo (carótida interna). Quando se tornam confluentes na base do crânio, esses sistemas formam um polígono, que foi nomeado com o epônimo do grande pesquisador que o descobriu: Thomas Willis. Esse polígono é formado pelas seguintes artérias: cerebral posterior, comunicante anterior, carótida interna, cerebral posterior e comunicante posterior. A importância desse polígono é refletida no que foi chamado de redundância da circulação cerebral. Este fenômeno é importante porque, à medida que alguma obstrução ou estenose ocorra em qualquer uma dessas artérias pertencentes ao polígono, a circulação cerebral de maneira geral não é prejudicada de maneira significativa, pois as outras artérias conseguem suprir a deficiência de qualquer uma delas. Esse fato é extremamente importante no caso de embolias cerebrais ou condições que promovam estenose das artérias cerebrais, diminuindo a extensão do dano sofrido por esses pacientes.
Considerações finais
Conhecido como o “pai da neurociência”, Thomas Willis nos deixou no dia 11 de novembro de 1675, no auge de seus 54 anos, devido a complicações de uma doença chamada pleurisia, onde ocorre inflamação da pleura (camada que reveste os nossos pulmões e nossa caixa torácica). Embora tenha partido cedo, Willis deixou legados para a vida inteira. Tanto que, nos dias de hoje, não há um médico ou estudante de medicina quem não conheça o polígono de Willis ou pelo menos nunca tenha ouvido falar. Sua contribuição para a área da saúde foi tamanha que nomear um achado com seu nome é pouco em comparação com o benefício que a saúde pública ganhou com isso. Após ter lido atentamente este artigo, espero que você tenha se emocionado com a história de vida do criador do polígono mais importante do mundo: o polígono de Willis!