O que é a obesidade?
A Organização Mundial da Saúde (OMS) considera a obesidade como uma epidemia mundial condicionada principalmente pelo perfil alimentar e de atividade física. Sua crescente prevalência vem sendo atribuída a diversos processos biopsicossociais, em que o “ambiente”- seja ele político, econômico, social ou cultural- assume papel de destaque. Segundo essa visão, não apenas o indivíduo e as suas escolhas são os determinantes da obesidade; pelo contrário, os fatores ambientais assumem um lugar estratégico na análise do problema e nas propostas de intervenções. Contudo, ainda é uma tarefa desafiadora desvendar e compreender de maneira detalhada como esses múltiplos fatores interagem.
O que causa obesidade e excesso de peso?
A causa fundamental da obesidade e do excesso de peso é um desequilíbrio energético entre as calorias consumidas e as calorias gastas. Esse desequilíbrio energético, então, ao produzir o aumento do número de pessoas com sobrepeso torna- se assunto extremamente importante a ser discutido e explorado. Além disso, o aumento da industrialização, as modificações de hábitos alimentares e de estilos de vida, os quais podem impactar diretamente no preocupante cenário atual- em que vivenciamos o aumento do percentual da população obesa- tornam- se um grande problema de saúde pública.
O cenário atual no mundo contemporâneo
O problema da obesidade nitidamente não está restrito ao Brasil. Globalmente tem havido um aumento da ingestão de alimentos ricos em calorias e com elevado percentual de gordura. Adicionalmente, observa- se um aumento na inatividade física devido à natureza cada vez mais sedentária de muitas formas de trabalho, à mudança de modos de transporte e ao aumento da urbanização. Essas modificações nos padrões e na frequência de atividades físicas, bem como as alterações dietéticas são frequentemente o resultado de mudanças ambientais e sociais associadas ao desenvolvimento e à falta de políticas de apoio em setores como saúde, agricultura, transporte, planejamento urbano, meio ambiente, processamento de alimentos, distribuição, marketing e educação.
Por que a população está mudando tanto os hábitos alimentares? O que está acontecendo?
Quem nunca substitui uma refeição saudável por um lanche em algum fast- food? Quem nunca deixou de fazer algum exporte porque “não tem tempo” e está sendo “consumido pelo trabalho?”
Pois é…
No mundo contemporâneo, assistimos a um aumento progressivo da competitividade no ambiente de trabalho e ao aumento das exigências do próprio mercado por profissionais especializados, experientes e com boa titulação. Essa competição faz com que muitos sigam rotinas em que praticamente a totalidade das horas diárias são dedicadas às atividades laborais e ao estudo. Não é incomum um jovem que sai cedo de casa diretamente para o trabalho- durante o qual permanece sentado em geral realizando as atividades- e, logo em seguida, segue para algum curso, pós- graduação, MBA, dentre outros, sem se quer passar em casa para “descansar”. Essa falta de tempo crônica e, de certa forma, “patológica”, a qual parece constituir um ciclo vicioso e “sem fim”, faz com que tais indivíduos acabem abdicando das atividades físicas, seja pela escassez de tempo, seja pelo cansaço mental e físico devido ao fato de ficarem “ o dia inteiro fora de casa”.
Somado a isso, o cansaço e a falta de tempo podem também refletir na adoção de hábitos alimentares não compatíveis com uma vida saudável. Por exemplo, o fato de ter pouco tempo de almoço pode fazer com que as pessoas optem por comprar lanches nos famosos fast- foods, ou até mesmo optem por substituir as principais refeições por sanduíches comprados nas famosas cantinas. Somado a isso, o cansaço para preparar sua própria refeição em domicílio, bem como a falta de estrutura de armazenamento em determinados ambientes de trabalho tornam inviável, para alguns, levar a as famosas “quentinhas” de casa.
E a remuneração? Qual é o impacto do dinheiro nesse contexto?
Infelizmente, nem todos os trabalhos oferecem alimentação adequada aos funcionários. De forma análoga, mesmo os que oferecem tickets para refeições ou similares, muitas vezes disponibilizam valores incompatíveis com os custos das refeições nas proximidades do local. Mais uma vez, isso contribui para que muitos optem por uma alimentação mais “acessível” o que pode se traduzir em alimentos muito calóricos e com alto índice de gorduras.
Por outro lado, por mais que pareça ser paradoxal, à medida que os países pobres sobem a escala de renda e mudam das dietas tradicionais para as formas de comida ocidental, as taxas de obesidade aumentam. Um resultado dessa chamada “transição nutricional” é que os países de baixa e média renda enfrentam frequentemente um duplo ônus, já que enfrentam ainda problemas relacionados a doenças infecciosas que acompanham a desnutrição, especialmente na infância e, cada vez mais, são desafiados pelas doenças crônicas relacionadas à obesidade e ao estilo de vida ocidental.
Globalmente, estima-se que 43 milhões de crianças pré-escolares (com menos de 5 anos) tinham sobrepeso ou obesidade em 2010, um aumento de 60% desde 1990. O problema afeta países ricos e pobres e, por números, coloca a maior carga sobre os mais pobres : Dos 43 milhões de crianças em idade pré-escolar com sobrepeso e obesidade do mundo, 35 milhões vivem em países em desenvolvimento. Até 2020, se a atual epidemia persistir, estima- se que 9% de todos os pré-escolares terão excesso de peso ou obesidade – cerca de 60 milhões de crianças.
Atualmente, observa- se que as taxas de obesidade ainda são maiores em adultos do que em crianças. No entanto, em termos relativos, os EUA, o Brasil, a China e outros países viram o problema aumentar mais rapidamente nas crianças do que nos adultos. Será que, daqui a alguns anos, a maior parte da população obesa será composta por crianças? Isso é extremamente preocupante, não acha?
A transição nutricional
Nas últimas décadas, países da Ásia, do norte da África e da América Latina, inclusive o Brasil, vêm passando por importantes mudanças sociais, econômicas e demográficas que se refletem no perfil nutricional de suas populações. A esse conjunto de transformações que impactam na dieta e na saúde dá-se o nome de transição nutricional, a qual veio acompanhada pelo aumento da ingestão de alimentos ricos em açúcares e gorduras, o que, no geral, está associado ao aumento no risco de sobrepeso, de obesidade e de doenças cardiovasculares.
No Brasil, uma das características marcantes desse processo é o antagonismo entre uma situação anterior de desnutrição e a tendência atual à obesidade. Os dados epidemiológicos demonstram redução na taxa de desnutridos, principalmente crianças, e aumento na prevalência de excesso de peso na população brasileira.
No entanto, devemos lembrar também que muitos países de baixa e média renda vivenciam um desenvolvimento que, na maioria das vezes, ocorre de forma bastante desigual, o que se torna evidente na grande disparidade social e nas diferenças de disponibilidade de recursos básicos em cada região. Dessa forma, nesse momento de transição, ocorre frequentemente nesses países a permanência de problemas relativos a doenças infeciosas- com os impactos da subnutrição- e, ao mesmo tempo, vivencia- se um rápido aumento nos fatores de risco para doenças não transmissíveis, como a obesidade, particularmente no que concerne aos ambientes urbanos. Nesse contexto, não é incomum vermos desnutrição e obesidade coexistindo no mesmo país.
Uma vez instalado o excesso de peso e a obesidade, quais são as consequências comuns para a saúde?
A obesidade é um importante fator de risco para doenças não transmissíveis, como, doenças cardiovasculares- principalmente doença cardíaca e acidente vascular cerebral-, diabetes mellitus tipo II, distúrbios músculo- esqueléticos- especialmente osteoartrite- além de alguns tipos de câncer, incluindo endometrial, mama, ovário, próstata, fígado, vesícula biliar, rim e cólon.
Vale mencionar também que a obesidade infantil, além de provocar inúmeros malefícios ao indivíduo enquanto crianças- como dificuldades respiratórias, aumento do risco de fraturas, hipertensão arterial sistêmica, resistência à insulina e efeitos psicológicos- ela também está associada a uma maior chance de obesidade, de morte prematura e de incapacidade na vida adulta.
E o governo? E as instituições? Quais foram as estratégias implementadas para redução e prevenção da obesidade?
No Brasil, a obesidade torna-se objeto de políticas públicas nos últimos anos e o Ministério da Saúde, por meio do Sistema Único de Saúde (SUS), vem sendo o principal propositor de ações, o que é feito seguindo a tendência internacional. Sabe- se que desde a década de 1990, a Política Nacional de Alimentação e Nutrição (PNAN, 1999), do Ministério da Saúde, definiu diretrizes para organizar as ações de prevenção e tratamento da obesidade no SUS, sendo revisada em 2012, quando houve uma abordagem da temática de forma mais contundente. E não para por aí…
No ano seguinte, o Ministério da Saúde estabeleceu a linha de cuidado para obesidade como parte da Rede de Atenção à Saúde das Pessoas com Doenças Crônicas.
Achou que já seria o suficiente? Parece que não… Por isso, em 2006, no Brasil, foi instituído o Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, ou SISAN, o qual organiza ações implementadas por diferentes ministérios, abarcando desde a produção até o consumo de alimentos e tem como integrantes o “Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional” (CONSEA), bem como as Conferências Nacionais e a Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (CAISAN).
Esse último, o CAISAN protagonizou entre 2011 e 2014 a formulação do plano intersetorial de combate à obesidade o qual sistematiza recomendações para estados e municípios.
No entanto, apesar dos esforços já vigentes, medidas que visam às transformações nos “ambientes obesogênicos”, como a regulamentação da publicidade de alimentos, podem afetar os interesses comerciais. Dessa forma, observa- se que a operacionalização impõe desafios políticos e de gestão variados.
Como contornar essa situação? De que maneira o excesso de peso e a obesidade podem ser reduzidos?
O sobrepeso e a obesidade, assim como as doenças não transmissíveis relacionadas, são certamente evitáveis. No nível individual, as pessoas podem limitar o excesso de ingestão calórica a partir do total de gorduras e açúcares, investir no aumento do consumo de frutas e legumes, bem como de cereais integrais e nozes e, MUITO IMPORTENTE: praticar atividade física regular.
Nesse sentido, vale ressaltar que a responsabilidade individual apenas consegue ter seu efeito completo nos locais em que as pessoas têm acesso a um estilo de vida saudável. Portanto, no nível social é importante apoiar os indivíduos a seguir as recomendações dos profissionais de saúde, através da implementação sustentada de políticas com foco na população, que tornem a atividade física regular e as escolhas alimentares mais saudáveis disponíveis e facilmente acessíveis a todos, particularmente aos mais pobres.
Adicionalmente, a indústria de alimentos pode desempenhar um papel significativo na promoção de dietas saudáveis por meio da tentativa de redução do teor de gordura, de açúcar e de sal dos alimentos processados, por meio da garantia de que escolhas saudáveis e nutritivas estejam disponíveis a todos os consumidores, com preços mais acessíveis. Além disso, pode- se investir na restrição da comercialização de alimentos ricos em açúcares, sal e gorduras, especialmente aqueles destinados a crianças e adolescentes- como o que foi feito com a proibição de tais tipos de alimentos nas cantinas escolares. Outra estratégia interessante é a de assegurar a disponibilidade de escolhas alimentares saudáveis e fomentar o apoio à prática regular de atividade física no local de trabalho.
Nunca é cedo demais para começar a prevenir a obesidade
Pode- se dizer, portanto, que as taxas de obesidade estão aumentando progressivamente em todo o mundo. É evidente também que é muito, MUITO difícil para qualquer um que se encontra com sobrepeso perder peso, em qualquer idade. Prevenir a obesidade nos primeiros anos da criança- e mesmo antes do nascimento, por hábitos saudáveis durante a gravidez- confere uma vida inteira de benefícios para a saúde. Esse é, sem dúviads, o caminho mais promissor para reverter a epidemia global.