Fibrilação Atrial é a arritmia mais frequente na prática clínica com prevalência entre 0,5 e 1%. Os critérios diagnósticos de FA no ECG são ausência de onda P e intervalos RR irregulares.
Os principais fatores de risco são: valvulopatia mitral reumática, hipertensão arterial, hipertireoidismo, DPOC, idade avançada, sexo masculino, DAC, alcoolismo, obesidade, etc.
CLASSIFICAÇÃO:
– FA paroxística: É aquela que é revertida espontaneamente ou com intervenção médica em até 7 dias de seu início.
– FA persistente: Duração maior que 7 dias e menor que 1 ano.
– FA Persistente de longa duração: FA com duração maior que 1 ano.
– FA permanente: Casos em que as tentativas de reversão ao ritmo sinusal não serão mais instituídas.
– FA não valvar: FA na ausência de estenose mitral reumática, válvula mecânica ou biológica e plastia mitral prévia.
EXAME FÍSICO:
Pulso irregular, anisocardiosfigmia (ausculta de batimento cardíaco sem palpação de pulso periférico), variação na fonese de B1 e, classicamente, ausência de B4.
Atenção: Pacientes portadores de Fibrilação Atrial NÃO podem ter B4, pelo simples fato que a fisiopatologia da quarta bulha envolve a contração atrial, que gera um turbilhonamento de sangue contra um ventrículo hipertrofiado no final da diástole. Como na FA não há contração atrial, não tem como existir B4.
Em longo prazo, a FA pode causar formação de trombos dentro da cavidade atrial esquerda (apêndice atrial esquerdo) devido à estase sanguínea local. Por isso fenômenos embólicos são comuns nesses pacientes, sendo o AVE isquêmico o maior representante. A Fibrilação Atrial é a causa mais comum de AVE isquêmico cardioembólico. Outros sítios podem ser acometidos, gerando isquemia de membros, isquemia mesentérica, etc.
TRATAMENTO:
O primeiro ponto a ser avaliado em um paciente com FA é o seu estado hemodinâmico.
– Paciente instável hemodinamicamente devido à Fibrilação Atrial: o tratamento mandatório é a cardioversão elétrica sincronizada imediata.
Nesses casos, visto que o quadro é emergencial, fazemos a heparinização plena do paciente junto com a cardioversão elétrica, mantendo-o anticoagulado por, no mínimo, 4 semanas após a reversão.
Dizemos que há instabilidade hemodinâmica nos seguintes casos:
(1) Hipotensão arterial
(2) Edema agudo de pulmão
(3) Fase aguda do IAM
(4) Dor anginosa em repouso
(5) Rebaixamento do nível de consciência
Nesses casos, visto que o quadro é emergencial, fazemos a heparinização plena do paciente junto com a cardioversão elétrica, mantendo-o anticoagulado por, no mínimo, 4 semanas após a reversão.
Atenção: A cardioversão elétrica é realizada através da aplicação de choque com carga de 100-200J em desfibriladores monofásicos e de 50-100J em desfibriladores bifásicos. Deve-se fazer analgesia e sedação antes do choque.
– Paciente estável hemodinamicamente: não há urgência para a reversão da arritmia, portanto devemos levar em conta dois objetivos principais do tratamento:
- Controle da frequência cardíaca → alívio sintomático.
O controle da frequência cardíaca é obtido através do uso de medicações inibidoras do nódulo AV, que funciona como um filtro para a corrente elétrica que passa do átrio para o ventrículo. As medicações que possuem eficácia comprovada são: Diltiazem, Verapamil e Betabloqueadores.
ATENÇÃO! O digital só deve ser utilizado em pacientes com IC sistólica sintomáticos. Contudo, os beta-bloqueadores são as drogas de uso preferencial nesses casos.
Dizemos que a FC está bem controlada quando, em repouso, o paciente com Fibrilação Atrial mantém entre 60-80bpm e, no exercício, entre 90-110bpm.
Caso o paciente seja refratário ao tratamento medicamentoso otimizado para controle de FC, podemos lançar mão de manobras intervencionistas: Ablação do nódulo AV ou implante de marca-passo definitivo (módulo VVIR).
- Anticoagulação → prevenção de tromboembolismo.
Devido à estase de sangue no apêndice atrial esquerdo em pacientes com Fibrilação Atrial, existe uma chance razoável desses pacientes formarem trombos na cavidade atrial esquerda (por volta de 10-15%), que pode ser fonte emboligênica para qualquer sítio, principalmente as artérias cerebrais, gerando AVE isquêmico cardioembólico. Devido a isso, grande parte dos pacientes com FA deve ser anticoagulado de forma profilática.
Caso a FA tenha se instalado há MENOS de 48 horas, iniciamos a heparinização do paciente antes da reversão do ritmo, mantendo a anticoagulação por 4 semanas após a reversão. Não há necessidade de ECO transesofágico (ECOTE) previamente à reversão.
Caso a Fibrilação Atrial tenha se instalado há MAIS de 48 horas (ou com duração indeterminada), consideramos que o risco de já haver um trombo formado na cavidade atrial é grande. Portanto, devemos descartar a presença do trombo através da realização de um ECOTE ou – caso não haja ECOTE disponível – iniciamos anticoagulação plena por um período de 4 semanas. Após esse período, faz a cardioversão e mantem a anticoagulação plena por, no mínimo, mais 4 semanas após a reversão.
– Caso optemos pelo ECOTE, na ausência de trombo identificável, devemos realizar heparinização plena do paciente 6-12 horas antes da reversão e manter anticoagulação por mais 4 semanas.
– Caso haja trombo no ECOTE, lançamos mão de anticoagulação por 3-4 semanas e repetimos o ECOTE antes da reversão.
Para definirmos que pacientes deverão ser submetidos à anticoagulação plena, devemos utilizar os critérios de risco tromboembólico da ACC/AHA, CHA2DS2-VASc e avaliar o seu risco de sangramento com o score HAS – BLED:
CHA2DS2 – VASc = 0: Não anticoagular
CHA2DS2 – VASc: = 1: Considerar anticoagulação, a depender do risco de sangramento x trombose.
CHA2DS2 – VASc: = 2: Anticoagulação plena
HAS-BLED > 3: Maior risco de hemorragia pelo ACO.
ESSE SCORE NÃO CONTRAINDICA O USO DE ACO!
A anticoagulação plena pode ser realizada através das seguintes medicações:
1. Varfarina:
Inibidor da Vitamina K.
INR alvo entre 2 – 3. Necessário controle laboratorial periódico.
Interação com alimentos verdes escuros.
Antídoto: Vitamina K, Plasma.
2. Novos Anticoagulantes Orais:
2.1: Dabigatrana:
Foi o primeiro NACO disponibilizado e validado pelo estudo RE-LY.
É um inibidor direto da Tombina.
2.2: Rivaroxabana:
Foi validado pelo estudo ROCKET-AF.
Inibidor do Fator Xa
2.3: Apixabana:
Foi validado pelo estudo ARISTOTELE.
É um inibidor do fator Xa.
O antídoto dos novos anticoagulantes ainda está em fase de estudos.
C) Reversão para ritmo sinusal: Não há consenso quanto à indicação de reversão da Fibrilação Atrial. Em geral, indica-se para pacientes sintomáticos, com menos de 65 anos, refratários ao controle de frequência e naqueles casos onde há uma causa identificável reversível da FA (Ex: hipertireoidismo, sepse, etc) sem cardiopatia estrutural associada.
Como revertemos a Fibrilação Atrial?
Caso optemos pela reversão, podemos lançar mão da cardioversão farmacológica ou elétrica.
A cardioversão elétrica eletiva é realizada da mesma forma como foi explicada para os casos de FA com instabilidade hemodinâmica (choques de 100-200J monofásicos e 50-100J bifásicos).
Já a química pode ser realizada com os seguintes antiarrítmicos:
– Amiodarona IV: Dose de ataque (150-300mg em 30min) + Manutenção (1mg/min nas primeiras 8h e 0,5mg/min nas próximas 16h).
– Propafenona VO 600mg – dose única (contra-indicada em pacientes com disfunção miocárdica).
Após a reversão do ritmo para sinusal, devemos iniciar um antiarrítmico profilático oral para evitar a recidiva da Fibrilação Atrial. Dentre as drogas antiarrítmicas temos: Amiodarona, Sotalol e Propafenona. Em pacientes com disfunção de VE, devemos dar preferência à Amiodarona.
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Sou Silvio Aguiar, Psicológico com formação em Biofeedback e Neurofeedback. Temos um erro conceitual referente ao ritmo Sinusal saudável, onde o texto afirma que no ritmo normal temos a diferença temporal entre batimentos sucessivos constante. Esse conceito está errado. É exatamente o contrário. Quanto mais “irregular” for a diferença temporal, mais saudável é o organismo, desde que apresente a onda P positiva. A irregularidade ampliada na fibrilação atrial é fruto da desregulação elétrica da contratação dos átrios, como falado, porém, não é correto afirmar que não há variabilidade entre batimentos sinusais normais. Isso é importante, pois, dentro de tantos conceitos corretos, essa informação errada pode gerar uma descrença nos textos como um todo. Obrigado!
Olá, Sílvio! Agradecemos muito pela sua mensagem. Realmente, é interessante seu comentário sobre o conceito de variabilidade da frequência cardíaca. Porém, não há, no texto do Jaleko, nada escrito que a frequência sinusal normal seja absolutamente regular. Como você mesmo disse, a falta da variabilidade é um marcador de mal prognóstico (os principais estudos são em pacientes no pós infarto do miocárdico). É importante notar, porém, que o método para avaliação da variabilidade da frequência cardíaca não é o eletrocardiograma convencional. Por fim, nem todo ritmo cardíaco sinusal irregular é benigno, as pausas sinusais longas (>3s) e eventos de taqui-bradi são patológicas.
Um abraço,
Felipe Magalhães – Diretor Médico