Introdução:
Ao longo do curso de Medicina, nos deparamos com milhares de estruturas, fórmulas, sinais e até mesmo sintomas para decorar e memorizar. Não obstante, surgem, com isso, vários epônimos para complicar nossa cabeça e nos dar mais um motivo para sentar na cadeira e decorar esses diversos nomes, muitas vezes tendo que associá-los a algumas estruturas anatômicas, em sua grande maioria. Só que aposto que você nunca parou para pensar que os epônimos foram criados justamente para que uma determinada estrutura receba o nome de uma personalidade famosa. E essa personalidade, muitas vezes é a própria pessoa que descobriu aquela estrutura. Neste artigo, você irá conhecer um pouco mais da história do médico e pesquisador que descobriu a tuba de Eustáquio, ou tuba auditiva, como atualmente é conhecida, além de saber um pouco mais sobre como foi a sua trajetória dentro da Medicina.
Bartolomeo Eustachi:
Bartolomeo Eustachi foi um grande anatomista, nascido na cidade de San Severino, região próxima à Roma, no século XVI. Filho do médico Mariano Eustachi e Francesca Eustachi, que eram ambos médicos, não teve sua história muito detalhada, porém os seus pais sempre prezaram por uma educação bastante humanística, colocando-o para estudar nas melhores escolas da região, adquirindo um conhecimento humano sem igual. Ao que tudo indica, ele estudou Medicina no Archiginnasio della Sapienza, um instituto religioso fundado pelo papa e localizado na cidade de Roma.
No ano de 1540, retornou a sua cidade natal para praticar Medicina. Ainda em Roma, tornou-se médico do Duque Urbino e também trabalhou como professor de anatomia. Além disso, realizou diversas autópsias nos mais variados hospitais e aprimorou seus estudos na área de dissecação, com a qual se identificava bastante. Faleceu no ano de 1574, quando estava a caminho do Cardeal, a quem servia como médico, na cidade de Fossombrone.
Contribuições para a Medicina:
Diversos trabalhos foram escritos e publicados por Bartolomeo Eustachi. Dentre eles, uma quantidade considerável de estudos acerca dos rins do ser humano, assim como estudos sobre o sistema auditivo, sistema venoso e até mesmo sobre a arcada dentária. Em suas publicações sobre os rins, o descobridor da tuba de Eustáquio demonstra um trabalho com grandes detalhes sobre o sistema renal humano, contendo, inclusive, o primeiro relato feito por um médico acerca da glândula suprarrenal, uma pequena glândula localizada na superfície posterior de ambos os rins, que possui como função a liberação de alguns hormônios, como, por exemplo, o cortisol, a aldosterona e os andrógenos renais. Neste mesmo trabalho, ele evidenciou as diferenças anatômicas que os indivíduos possuíam entre si, denominadas como variações anatômicas.
Já em seu estudo sobre os dentes, na “Opuscula Anatômica”, livro que foi publicado por ele, Eustachi relatou, com detalhes baseados na dissecação anatômica, a primeira e a segunda dentições, assim como as estruturas responsáveis pela composição dos dentes, como, por exemplo, o esmalte e a dentina, tentando ainda correlacionar essas estruturas entre si e explicar o motivo desses dentes desenvolveram sensibilidade a determinados alimentos.
Em sua “Opuscula Anatômica”, descreveu diversas placas que continham variadas estruturas da anatomia humana. Placas estas que ficaram bastante conhecidas por sua facilidade na leitura, pois elas continham uma borda característica, aonde os leitores conseguiam localizar as estruturas anatômicas de interesse, sem precisarem utilizar números e/ou letras.
Todavia, foi o seu estudo sobre o sistema auditivo que lhe deu mais fama perante a comunidade médica. Nesse estudo, Bartolomeo Eustachi forneceu, para os seus leitores, as informações corretas sobre a tuba auditiva, que veio a receber o seu nome, em consideração pelos estudos realizados. O estudo tem relatos sobre o músculo tensor do tímpano e o músculo estapédio. Contudo, seu descobrimento mais relevante foi a conexão que existia entre o ouvido médio dos seres humanos e a faringe, em um local chamado de tuba auditiva ou Tuba de Eustáquio, como ficou posteriormente conhecida, e ainda é até hoje. Há relatos de que essa descoberta inspirou obras de Shakespeare mais tardiamente, como o clássico Hamlet.
Outros trabalhos em que ele concluiu fora desta área também foram realizados pelo grande autor da Tuba de Eustáquio, como os relatos detalhados acerca da veia ázigo e das suas variadas ramificações. Nesse mesmo trabalho, ele também descreveu o ducto torácico (que era nada menos do que o maior ducto linfático presente no corpo humano) e a válvula de Eustáquio. Essa válvula é uma estrutura que deságua na veia cava inferior, existente durante a nossa vida intrauterina. Ao nascimento, ela involui, porém continua a ser detectada em exames de rotina, a medida que for pesquisada nos pacientes adultos.
Tuba de Eustáquio:
A Trompa de Eustáquio, descrita por Bartolomeo Eustachi, também conhecida como Tuba Auditiva, nada mais é do que a estrutura que Eustachi evidenciou uma conexão entre dois sistemas distintos. Ela estabelece uma conexão entre a faringe e o ouvido médio, e essa conexão é que é importante para o regulamento da pressão do ar que passa pela membrana timpânica. Essa tuba auditiva é composta por um componente cartilaginoso, localizado próximo à nasofaringe, e um componente ósseo, localizado próximo a orelha média. Normalmente, em condições naturais, ela encontra-se totalmente fechada, se abrindo somente quando houver a ação do músculo tensor do véu palatino, assim como a contração do músculo levantador do véu palatino, ambos fixados na porção externa da Trompa de Eustáquio.
Há também outros meios de fazer com que essa válvula se ative, como, por exemplo, durante a deglutição e quando bocejamos. A ativação dessa válvula na tuba de Eustáquio, nessas circunstancias, irá permitir que o ar passe da nasofaringe em direção a orelha média, mantendo essa região arejada. E todo esse mecanismo possui como objetivo principal a manutenção da pressão no interior do ouvido médio, evitando, assim, que ocorra complicações de acordo com as alterações bruscas na pressão.
Além da função de permitir que a região seja aerada e impedir alterações bruscas na pressão do local, a tuba confere a proteção da orelha média de determinados ruídos, patógenos e até mesmo de secreções provenientes da nasofaringe. Outra função considerada importante é a drenagem de secreções que, por ventura, possam acabar caindo no terço médio da orelha. Nesse momento, entra em jogo o músculo tensor do véu palatino, que faz com que essas secreções sejam encaminhadas até a faringe.
Conclusão:
Se não fosse pelos estudos de Bartolomeo, nós não reconheceríamos e nem daríamos a devida importância a essa estrutura, fato este que iria conferir um maior risco de disfunções da Trompa de Eustáquio. Quando essa região entra em disfunção, os pacientes passam a apresentar sintomas, como, por exemplo, plenitude auricular (sensação de que o ouvido está cheio ou tapado), zumbido e até mesmo autofonia. O tratamento para essa condição, embora um tanto quanto delicado, é bastante realizado quando o diagnóstico da patologia é feito corretamente. E foi com os estudos de Eustachi que conseguimos correlacionar a fisiopatologia da doença com os sintomas clínicos apresentados pelo paciente, aumentando o número de pacientes diagnosticados e tratados, mas, por outro lado, reduzindo o número de pacientes que evoluem para complicações da doença. É por estas e outras que o estudo dos epônimos ganhou bastante espaço no mundo atualmente, pois a medida que conhecemos os autores por trás dessas descobertas, conseguimos estar um passo na frente da doença que acomete os nossos pacientes. Até a próxima!