Introdução:
A síndrome de Sjögren (SS) é uma doença sistêmica inflamatória crônica, de provável etiologia autoimune, desencadeada pela hiper-reatividade dos linfócitos B, que se convertem em plasmócitos e produzem anticorpos contra antígenos do epitélio dos ácinos e dos ductos das glândulas exócrinas.
As glândulas lacrimais e salivares são os principais órgãos afetados pela infiltração linfo-plasmocitária, acarretando xeroftalmia (olhos secos) e xerostomia (boca seca). Outras glândulas exócrinas também podem ser acometidas como o pâncreas, glândulas sudoríparas, glândulas mucosas dos tratos respiratório, gastrointestinal e urogenital.
A SS pode existir como doença primária das glândulas exócrinas (SS primária) ou estar associada a outras doenças autoimunes como artrite reumatoide, lúpus eritematoso sistêmico, esclerodermia, doença de Graves, dentre outras (SS secundária).
A SS é mais comum entre indivíduos na quarta e quinta décadas de vida, sendo as mulheres mais acometidas do que os homens. Além disso, os pacientes com SS apresentam elevada incidência de linfoma maligno de células B tipo não-Hodgkin, quando comparada com a da população sadia.
Manifestação Clínica:
– Xeroftalmia, sensação de corpo estranho, fotofobia, turvação visual, hiperemia conjuntival e úlcera de córnea.
– Xerostomia, dificuldade na deglutição de alimentos sólidos, dor à deglutição, aftas e úlceras na mucosa labial e infecções.
– Artralgia, ressecamento da mucosa nasal, pele ressecada com prurido e eczemas, fenômeno de Raynauld e vasculites.
Auto-anticorpos:
Anticorpos contra ribonucleoproteínas: anti-Ro (SS-A) e anti-La (SS-B) são muito frequentes nos pacientes com SS primária. Já o Fator Reumatoide e o FAN são mais frequentes na SS secundária que na primária.
Diagnóstico:
O diagnóstico da síndrome de Sjögren baseia-se em critérios recentemente modificados em 2002 pelo “American-European Classification Criteria” com sensibilidade e especificidade de aproximadamente 95%.
Critérios europeus modificados pelo Grupo de Consenso Americano-Europeu (2002):
1. Sintomas oculares: pelo menos uma resposta afirmativa para uma das três questões formuladas abaixo:
a) Tem problemas oculares diários e persistentes, relacionados a quadro de olho seco há mais de três meses?
b) Tem sensação de areia ou queimação ocular?
c) Usa colírios lubrificantes mais de três vezes ao dia?
2. Sintomas orais: pelo menos uma resposta afirmativa para uma das três questões formuladas abaixo:
a) Tem sensação de boca seca há mais de três meses?
b) Tem inchaço recorrente ou persistente das glândulas salivares, na idade adulta?
c) Sente necessidade de ingerir líquidos para ajudar na deglutição de alimentos sólidos?
3. Sinais oculares: pelo menos um dos dois testes abaixo é positivo:
a) Teste de Schirmer I (≤ 5 mm em 5 minutos);
b) Rosa Bengala (≥ 4 pontos na escala de Bijsterveld);
4. Achados histopatológicos:
Aglomeração de pelo menos 50 células mononucleares numa biópsia de 4 mm2 da glândula salivar.
6. Auto anticorpos: presença de pelo menos um dos seguintes anticorpos séricos:
a) Anticorpos contra os antígenos Ro/SS-A ou La/SS-B;
b) Anticorpos anti-nuclear;
c) Fator reumatoide;
Critérios de exclusão:
Linfoma pré-existente, AIDS, sarcoidose ou doença do enxerto x hospedeiro.
Provável SS primária: Presença de pelo menos 3 dos 6 itens.
SS primária: Presença de pelo menos 4 dos 6 itens (aceitando como padrão sorológico positivo apenas SS-A ou SS-B).
Provável SS secundária: Combinação da resposta positiva para os itens 1 ou 2 com pelo menos 1 item positivos entre as questões 3, 4 ou 5.
SS secundária: Combinação da resposta positiva para os itens 1 ou 2 com pelo menos 2 itens positivos entre as questões 3, 4 ou 5.
Tratamento:
Não há, até o momento, cura para a SS. O tratamento tem por objetivo o alívio dos sinais e sintomas, com consequente melhora na qualidade de vida dos pacientes, além da modificação no curso da doença a fim de que as sequelas sejam evitadas ou minimizadas.
1) Tratamentos substitutivos e de retenção: administração de colírios lubrificantes sem conservantes, pomadas e gel muitas vezes são suficientes para proporcionar alívio dos sintomas oculares e prevenir complicações corneais. Higiene oral rigorosa é importante para prevenir infecções bucais. Para alívio da xerostomia, gomas de mascar sem açúcar, água com gotas de limão, agentes mucolíticos como a bromexina e formulações de saliva artificial podem ser úteis no alívio dos sintomas.
2) Estimulação da produção de lágrima e saliva: agonistas muscarínicos de uso oral, como a pilocarpina e a cevimelina agem nos receptores muscarínicos das glândulas estimulando a secreção salivar e lacrimal com melhora do quadro clínico e poucos efeitos colaterais associados.
3) Redução da inflamação local: administração tópica de corticosteroides reduz o processo inflamatório, estabiliza a superfície ocular, melhora sinais e sintomas oculares, mas seu uso prolongado está associado a efeitos colaterais como glaucoma e catarata.
4) Modulação da resposta imune: agentes imuno-moduladores que diminuem a intensidade da resposta imune, reduzem a linfo-proliferação e a produção dos autos anticorpos podem estar indicados. O uso sistêmico de corticosteroides melhora os sinais e sintomas da doença, mas devido aos seus efeitos colaterais, ficam reservados para as manifestações extra glandulares da SS. Hidroxicloroquina, ciclofosfamida e metotrexato são utilizados nos casos mais graves e de difícil controle.